2.11.12

Interlúdio IX

«Não há rigor que não dissimule angústia.» Hermann Broch
Eis o ponto de partida para a rememoração ou criação de uma pequena história. O resultado é perturbador.
As histórias põem em cena a família e a escola. Previsível! Só não esperava encontrar tanta psicologia de algibeira: as mães e os professores (as) rigorosos (as) não passam de gente bem intencionada, mas traumatizada.
E esses traumas escondidos, mas que os rebentos antecipam facilmente, só servem para provocar angústia nos infantes.
O esquema é elementar: a angústia é filha do rigor; a autoconfiança dá-se bem com a orfandade... 
Ao contrário de outras gerações, esta parece caracterizar-se por uma certa precocidade que se revela na procura de um palco que lhes estimule o vedetismo...
( Estes pensamentos são necessariamente bem educados!)
 
 

1.11.12

Inevitavelmente...

Tentando não assombrar quem por aqui passe, deixei de falar de políticos, pois sinto-os desenraízados, vendidos a interesses ou a doutrinas mal assimiladas. Incapazes de pensar por si, vivem cercados de técnicos nacionais e estrangeiros que, ignorantes do território e das gentes, cortam a direito como já no século XIX as potências europeias tinham feito com África...
De qualquer modo, esta cegueira não afeta apenas os governantes. No geral, voltámos as costas ao território e ao seus recursos, preferindo as soluções urbanas, em regra importadas... Cidadãos do mundo, consumimos desenfreadamente e perdemo-nos facilmente nas redes sociais e na delinquência, umas vezes gratuita outras sanguinolenta... Temos as nossas próprias festas e, não satisfeitos, adaptamos todas as alheias.
O espírito dionisíaco esmaga o apolíneo, conduzindo inevitavelmente à decadência, sob o guloso olhar calvinista.
Resta-me a consolação de um território que entregue a si próprio vai impondo as suas próprias regras como se há muito tivessemos partido!

Dia XXVII

O Dia chega atrasado. A escrita procura recuperar um tempo irremediavelmente perdido, tal como o comprova aquele aluno que tem dúvidas sobre a matéria do teste, pois, desesperadamente, foge da leitura de Um Auto de Gil Vicente e de Amor de Perdição, como o diabo da Cruz, o que me dá o mote para, aqui, relembrar a composição da personagem João da Cruz.
Apesar do manual (Projectos de leitura I, páginas 221-222) convidar a um exercício de caraterização do herói romântico, ontem armei-me de um Dicionário de Língua Portuguesa, e todo o trabalho se centrou na leitura do excerto do capítulo VI. Após leitura acompanhada da simples tarefa de identificar as palavras que oferecessem resistência à compreensão (três!), o retorno à leitura dirigiu a atenção para o significado literal e figurado das palavras, para o recurso a processos de equivalência semântica (sinonímia), para a origem do léxico de João da Cruz, para os registos de língua do narrador, de João da Cruz e de Simão Botelho, como expressões da multiplicidade de recursos presentes na escrita camiliana.
Vale a pena atentar na quantidade de nomes comuns e de verbos transitivos ativos no diálogo (e consequente significado literal e figurado):  Este desalmado deixou fugir o melro (...) mas o meu lá está a pernear (...) Sempre lhe quero ver as trombas ( ...) o ferrador desceu três socalcos da vinha (...) Alma de cântaro (...) ou no discurso do narrador: João da Cruz, como galgo de fino olfacto, fitou a orelha e resmungou. A comparação como processo de caraterização, em que a bestialiazação, agora positiva, é posta em evidência.
A bestialização com recurso a nomes comuns: melro, trombas, galgo, porco do monte, javali, furão. Fácil é perceber a simpatia do autor por esse universo campestre e efetivo conhecimento do léxico adequado, chegando ao ponto de, para construir o espaço que se torna de caça (ao homem), usar uma rica sinonímia que acaba por confundir o leitor urbano: matagal, mato, rostilhada, moita, bouça...
 
De pouco servirá este registo, mas este foi o caminho seguido na aula de ontem! Pobre herói romântico! A atenção de Camilo estava toda centrada na força e na inteligência do caçador e não na irrefletida mansidão de Simâo... ( Ao fim da tarde, recebi um e-mail de quem esteve na sala de aula a perguntar qual era a matéria...)
 

30.10.12

Dia XXVI

(A modéstia parece estar em extinção!)
I - Comentário (teste 1b): falta de rigor na utilização da palavra escrita; dificuldade em distinguir vivência de memória literária; excessiva paráfrase; alguma qualidade na composição; visão circular e narcísica; expetativa exagerada...
II - Distinguir: facto, sentimento,  opinião. Dêixis.
Exemplos: a) Estou aborrecido; b) Ontem, estive aborrecido; c) Ontem, estava aborrecido; Hoje, estou aborrecido! 
A História da língua e da cultura, se perspetivadas, ensinam-nos que os processos de construção da opinião (Grécia antiga - doxa; Enciclopedistas do séc. XVIII ) visavam libertar o ser das cadeias da autocracia... Hoje, a banalização da opinião ( redundantemente, pública) tornou-se numa forma de empobrecimento da democracia...
 
II - O herói romântico
O melhor exemplo é Lord Byron, com a incompatibilidade entre as reivindicações morais do individuo e as convenções da sociedade. O herói está fadada a ser um vagabundo eterno, sem pátria, em revolta aberta como o seu tempo.
Esta angústia, a verdadeira doença do século, produz inquietação/ desorientação/ sentimento de isolamento/ culto ressentido da solidão/ a perda de fé nos antigos ideais/ individualismo anárquico/ namoro com a morte. O herói romantico ama ser um maldito, é masoquista, faz alarde de suas feridas, flageladores de si proprios.
Em relação à humanidade, é um misantropo, solitário, anjo caído, feição demoníaca e narcisista. Por vezes, apresenta-se como um homem misterioso, cujo passado é um segredo (um pecado terrível, um erro desastroso ou a falta irreparável). É rude e indomável. Herói demoníaco que tende a si e aos outros à destruição.
 
 
III - Uma linha de construção do romance Amor de Perdição é consciente (ou inconscientemente) o papel da Justiça na sociedade da primeira metade do século XIX.

29.10.12

Dia XXV

I - Em Interlúdio VIII, o apelo à descrição do aparelho de pesca visa desenvolver a objetividade e o espírito crítico, e, simultaneamente, alargar o léxico, no caso das "artes de pesca", e a construção de texto. Hoje, para além dos dicionários e glossários, há outras ferramentas, em particular, de imagem que podem ser bons auxiliares de trabalho.
 
II - No que refere à correção do teste (1a), foram detalhados os seguintes itens: 
a) o retrato como meio de imortalizar os que se distinguiram por ações em favor da humanidade, ou mais comummente, de algum grupo (Agustina) ou, desde o romantismo, como forma de subversão da referida ideia... até que a fotografia chegou...
b) o pretérito perfeito, semanticamente esprime ações concluídas, sem impacto no momento da enunciação (anterioridade);
c) o recurso à 3ª pessoa na construção de um autorretrato (Manoel Bandeira) como forma de distanciamento do sujeito de enunciação - o poeta desajeitado, provinciano e sem espiritualidade terá ficado para trás...
d) a necessidade de valorizar o vocabulário escolhido pelo autor, de modo a não cair em erros de interpretação - «tísico profissional» ...
 
III - Excertos dos capítulos IV e XIV de Amor de Perdição. O narrador caracteriza Teresa, distanciando-se da heroína, pois esta era um produto de sociedade manhosa e hipócrita, dominada pelas convenções... e neste caso, Teresa obedece ao padrão literário da época - pronta a tudo sacrificar por amor (ou será por desafio à autoridade paterna?). Por outro lado, no capítulo IV, o narrador instala-se na 1ª pessoa, conduzindo um diálogo irónico com "os finos entendedores" e chegando ao ponto de brincar com o leitor, embora espere a sua cumplicidade: «Diz boa gente que não, e eu abundo sempre no voto da gente boa.»  
No XIV capítulo, a narrativa recria um diálogo dramático entre pai e filha, em que a tensão dramática vai crescendo... com vitória de Teresa, apesar de não devermos esquecer as palavras do narrador: «os melhores fins se atingem por atalhos onde não cabem a franqueza e a sinceridade.»  
Em pano de fundo, continua o diálogo inaugurado por Rousseau entre Natureza e Sociedade ( o mito do bom selvagem).

28.10.12

E o mar ali tão perto!

Às 15h50, deixei o parque de Campismo FORTE DO CAVALO, em Sesimbra. Fui o último campista a sair! E fiquei a pensar que há  Câmaras Municipais que não têm jeito para o negócio. Talvez, o presidente da Câmara de Sesimbra pudesse solicitar uma ajuda ao de Mafra ou, pelo menos, talvez pudesse fazer uma visita ao parque de MIL REGOS, Ericeira...  


Interlúdio VIII

Forte do Cavalo, Sesimbra.
O Sol brilha e o céu continua azul. Lá em baixo, o porto de abrigo. À esquerda, o castelo alcandorado.
O professor classifica testes, com a preocupação de diagnosticar os níveis de compreensão e de expressão. Tudo o resto se torna secundário.
Esgotada a primeira turma, concluo que apenas dois alunos revelam compreensão e expressão insuficientes, em 28.
Em síntese, a maioria dos alunos surge preparada para as novas tarefas.
Para o caso de algum aluno estar atento a este blogue, aqui lhe deixo uma proposta de escrita: DESCREVER e COMENTAR a ferramenta visível no convés...