17.10.10

Esquecimento…

Muito do que sei (ou já soube ?) devo-o a alguém. Por exemplo, o que, ainda, sei sobre Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa, em parte, bebi-o na obra comprometida de Alfredo Augusto Margarido que me ensinou o caminho para essa fundadora CASA que, contrariando os objectivos do Estado Novo, nasceu no seio da Casa dos Estudantes do Império (CEI). Sem ela, a CEI, e sem ele, Alfredo Margarido, o CASA lusófona seria bem diferente. É, também, dele, Alfredo e da CEI que nos fala PEPETELA, na 1ª parte de GERAÇÃO DA UTOPIA, “A CASA”, um romance a (re)ler.

Ora, o Alfredo Augusto Margarido, morreu silenciosamente no dia 13 de Outubro, aos 82 anos. E esse silêncio faz-me pensar que até já os correlegionários perderam a memória.

16.10.10

Na hora…

Por vezes, em dia de balanço, acordamos cáusticos, com vontade de zancar nos fornecedores de serviços que nos prometem mundos e fundos para depois nos cobrarem o que, ingenuamente, acreditámos não dever. No caso, a Portugal Telecom que me prometeu uma migração simples (e livre de encargos) do sapo adsl para o sapo fibra, e que me fez perder  paciência e horas, senão dias, de reclamações para que o serviço ficasse a funcionar em condições. Foi mesmo necessário solicitar o livro de reclamações para que a situação fosse encarada com alguma seriedade. Foram 8 dias sem telefone e 5 sem acesso à internet. E 100 euros pelo equipamento e instalação! E porquê?

Porque a PT é como um grupo de actores sem encenador. Cada um interpreta o texto de acordo com o seu estado de alma, estando-se nas tintas para o autor e, sobretudo, sem se preocupar em ‘dar a deixa’ àqueles com quem deveria contracenar. Actores esses que, no caso da PT, como, por exempo, está a acontecer com a elaboração do OGE, representam em palcos simultâneos, mas distantes. Falta-lhes o encenador. O maestro.

Por isso a primeira causa da decadência é organizacional. A segunda é a inveja.

E é esta segunda causa que me leva à crónica de TV do DN “J de Judite, J de Justiça”, assinada por Nuno Azinheira, em tempos meu aluno. Gosto da clareza com que escreve e, sobretudo, da justeza do pensamento: «Reconhecer que há alguém mais competente, mais produtivo e melhor do que nós é uma coisa que nos incomoda. Está-nos sangue. E é por isso que continuamos assim. Tristes e amargurados. E incompetentes

O Nuno já não se lembrará, mas no tempo em que nos cruzámos, o professor de Português começava inevitavelmente a abordagem de OS LUSÍADAS pelo comentário do Prefácio de Garcia de Resende, inserto no Cancioneiro Geral. E lá estava  a marca do «sangue» que impedia os portugueses de escreverem , na hora certa, a epopeia merecida: «Todos estes feitos e outros muitos doutras sustâncias nam sam devulgados como foram, se gente doutra naçam os fizera. E causa isto serem tam confiados de si, que não querem confessar que nenhuns feitos são maiores que os que cada um faz e faria, se nisso o metessem.»

Hoje, apesar da desorganização e da inveja, ainda vislumbro nas palavras do Nuno Azinheira um sinal de esperança.

15.10.10

Fibra a fibra…

«O tempo é terrivelmente longo, fibra a fibra, e de repente – por onde se escoa ele?» José Rodrigues Miguéis, A Escola do Paraíso

De tal modo se escoa o tempo, que, ultimamente, tenho evitado falar dele. Os sinais de quebra acentuam-se a cada passo e, paradoxalmente, a CRISE torna as horas absurdas e estupidifica as mentes em ânsias ensurdecedoras…

Falta o tempo e, ao mesmo tempo, cresce o desânimo. Há vidas que subitamente perdem sentido. Parece que regressamos aos tempos dos «vencidos da vida»…, ou da estagnação do «estado novo»…

A CRISE alastra punindo quem cumpre e /ou quem tem menos recursos, enquanto a economia paralela sobrevive impune. Não só o Governo não explica como é que delapida as receitas fiscais e os empréstimos sucessivos obtidos no exterior, como descura a fiscalização de uma multiplicidade de actividades que não pagam qualquer tipo de impostos.

O novo orçamento de estado reduz a pele e o osso o cidadão cumpridor. Ao lado, engordam os onzeneiros e os cadongueiros…

9.10.10

Acumulação…

Há palavras que, de vez em quando, ganham vida, como ‘acumular’, ‘cúmulo’, ‘acumulação’… Consideradas a situação financeira, a taxa de desemprego, a estagnação económica  e a carga fiscal que se abate sobre a maioria dos portugueses e, em particular, sobre a administração pública, o possível humor que o despertar destas palavras poderia desencadear já não faz qualquer sentido.

Sejamos sérios. Como é que alguém pode justificar as situações de acumulação de tarefas e de remunerações quando uma boa parte da população (qualificada ou não) se encontra inactiva por falta de trabalho?

O argumento da falta de qualificações para o exercício de certos cargos é absurdo, sobretudo, quando sabemos que essa dificuldade pode ser ultrapassada com FORMAÇÃO, competente e dada por quem, de verdade, conheça as matérias em questão.

Num país em que os recursos são limitados, não há justificação para que uma minoria se aproprie de grande parte do orçamento, deixando à míngua centenas de milhares de portugueses. Há que proceder à redistribuição do trabalho, começando por eliminar a acumulação de funções em todos os sectores da vida nacional.

E também há que acabar com a acumulação de subvenções (e pensões) resultantes do exercício temporário, e muitas vezes simbólico, de cargos de nomeação política.   

O mal corta-se pela raiz!

O cúmulo surge, hoje, na primeira página de alguns jornais: O Governo prepara-se para recuar no corte da acumulação de remunerações e de pensões, a começar pelo presidente da República.

6.10.10

Só hoje…

Andava há dias na expectativa de chegar à ‘República’ revisitada pelo José Rodrigues Miguéis, n’A Escola do Paraíso. Cheguei atrasado por culpa da Portugal Telecom que, entretanto, me tem obrigado a desdobrar-me em diligências por causa de uma, aparente, simples migração da Sapo adsl para a Sapo fibra. Nada é, de facto, simples neste moribundo Portugal republicano, onde tudo é feito para emular a 1ª República.

Ontem, desconcertado quanto às celebrações do centenário, ainda visitei o Museu Bordalo Pinheiro, onde descobri um caricaturista digno de ser louvado: SILVA MONTEIRO. Este mostra-nos que, afinal, os ideais foram substituídos pelos interesses de grupos mais ou menos ávidos de se banquetearem à mesa do orçamento. Aqueles republicanos, à excepção de alguns ilustres suicidas, não enganavam ninguém! Ora, ontem, o que eu ouvi foi, sobretudo, a legitimação de actos que custaram a vida a muitos milhares de portugueses que se viram envolvidos em causas perdidas.

(E continuamos a correr atrás de desígnios que nem sequer conseguimos enunciar enquanto outros mamam à tripa forra. Coitados!)

Entretanto, dando a palavra a José Rodrigues Miguéis, um dos escritores que melhor conheceu e retratou a acção republicana, transcrevo um excerto da obra já mencionada:  

«O prédio embandeirou, mas só do lado esquerdo, numa espécie de hemiplegia republicana. Havia sempre um resto de serpentinas do Carnaval passado, e foi uma festa. Começavam-se a vender nas ruas bandeiras, alfinetes, postais e globos de vidro colorido com cenas  e retratos dos homens do regime. Era uma Vida Nova que raiava. Dir-se-ia que estava tudo preparado para a celebração! Passavam bandos aos vivas, caminho da Baixa, da Rotunda, do Tejo, cantando a Portuguesa. Afluíam de todos os lados os heróis da última hora: as barricadas, até ali quase vazias, transbordavam agora de combatentes, eriçadas de armas que não tinham chegado a dar fogo. Tiravam-se grupos memoráveis, para depois se dizer “Eu também Lá estive!” A República estava de antemão solidamente implantada nas almas e nas ruas. Lisboa transfigurada!» 

5.10.10

Silva Monteiro N’Os Ridículos

 Urge passar por lá, pelo Museu Bordalo Pinheiro. N'Os Ridículos (1908-1926), podemos encontrar os 'actores principais' deste nosso tempo (1974-2010). Pena é que os caricaturistas não tenham dado continuidade às criaturas de Bordalo Pinheiro.


30.9.10

O Tempo das Palavras…

 
 

«Não respiro o passado, quero lá saber do / que foi por já ter sido, ou do que fui», António Souto, O Tempo das Palavras

Os poetas são homens e mulheres virtuosos porque dizem sempre o que sentem, mesmo quando o enunciado parece aprisionar o leitor.

O Tempo das Palavras, rigorosas, castas e melódicas, esconde e revela um tempo de acção primordial na descoberta do amor e da escrita. E desse tempo, nas palavras ditas, eleva-se uma perda por assumir ou, em alternativa, a consciência de que a única superação é de ordem estética.

Descoberto o caminho, o poeta deve dizê-lo até ao fim…

PS: Peço perdão ao Armindo S. de, por enquanto, nada dizer das suas palavras.