29.6.09

Apesar da cor…

Apesar da cor que envaidece, a raiz é imperceptível. Qualquer golpe de vento a seca e humilha. À sombra do arbusto, floresce enquanto a duna a não sufoca.

27.6.09

A guerrilha política…

A actividade principal da classe política e seus satélites é a guerrilha. O Governo deixou de ter um rumo e mais não faz do que tentar responder à sabotagem permanente… E como se sabe, o único objectivo dos múltiplos grupos de guerrilheiros é a conquista do poder, mesmo que isso signifique a destruição total das poucas forças produtivas…

Não se percebe para que serviu a maioria absoluta, se qualquer franco-atirador pode perturbar a governação e intoxicar a opinião pública, tornando-a volátil e caprichosa.

Em democracia, os governos eleitos por sufrágio universal deveriam poder governar até ao último dia do seu mandato… e os eleitores, em novas eleições democráticas, diriam se os eleitos tinham estado à altura dos acontecimentos ou não…

22.6.09

O futuro atormenta-me…

Não o meu, que, incapaz de acompanhar as exigências do tempo que corre, se torna cada vez mais passado inventado, porque o outro, o perfeito, se recusa a sair da toca…

Agora, quando me prometem um futuro radioso, desconfio. Se não vejo o projecto bem delineado, fico inquieto, não por mim, mas por meus filhos, pelos teus filhos e, sobretudo, pelos filhos que desconheço… Estes a que ninguém dá atenção e em nome dos quais se fazem as revoluções…

Hoje, a voz promissora de vários militantes ecoa no meu cérebro dividido: um leve arrebatamento esmorece à falta de projecto que dê rosto aos filhos que desconheço…

Daqui em diante, vou estar mais atento a esses filhos que bem poderiam ser meus… esse é o meu futuro!

Quanto ao resto, vou  distanciar-me para que a insustentável leveza do ser não me atraiçoe…

20.6.09

Junho, em Lisboa…

 Quando o calor ataca, sobre a relva artificial, anima-se o bairro…, mostram-se as artes performativas: os audiomenus despertam a atenção. Toma-se, na esplanada ou na relva, uma bebida ou uma refeição ligeira, e, simultaneamente, ouve-se uma peça radiofónica, à escolha. E eu que procurava reler O Render dos Heróis de José Cardoso Pires, ia pensando no modo como uma peça radiofónica poderia dar conta daquele «luar negro» que assombrava um povo dos confins do Alto Minho, e do «pano negro» que, ao abrir, dava conta da montanha e do vale, do terreiro e do cruzeiro, das «ferramentas de trabalho» aprendidas ao povo do Vilar. E sobretudo daquele Cego que fingia desconhecer a sua imagem e respectiva sombra, e que recitava a «Ladainha dos Bons Entendimentos». Talvez no próximo ano lectivo eu recorra ao audiomenu para que os meus alunos se deixem penetrar pelo discurso cénico (mas como?) que exige do leitor um verdadeiro esforço de leitura e de interpretação da História ( revolta da Maria da Fonte/ Salazarismo do início dos anos 60). Bem sei que alguns pensam que basta ler um resumo, e porque não sob audiomenu? O único inconveniente seria a obesidade.      Ali ao lado, na sala de ensaios do Maria Matos, Tiago Rodrigues experimentou, recorrendo à “dobragem” de vozes, sobrepor às palavras de um telejornal, outras palavras, procurando parodiar os acontecimentos do dia. O desempenho foi bom, mas tudo depende da qualidade do texto sobreposto.

Tudo isto num dia, em que percorri por três vezes o Parque de Saúde Mental, à procura do pavilhão 28. Paradoxalmente, não senti o calor infernal da Avenida de Roma, mas percebi que é difícil cumprir o código da estrada naquele labirinto e, também, reforcei a ideia de que a educação e a cultura, em Portugal, são apenas para gente abastada ou subsidiada. Como se compreende não me estou a referir ao Toni (?) Carreira que conseguiu entupir com autocarros de longo curso metade da Avenida Gago Coutinho. Talvez o Mário de Carvalho por lá tenha passado (pela avenida) e tenha decidido actualizar A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho!

16.6.09

Inaceitável... Constâncio

"- Ingenuidade? -Talvez."
Constâncio, homem de boa memória e raciocínio jesuítico, admite que talvez tenha sido ingénuo. E porquê?
Porque nas organizações actuais predominam os laços ideológicos, interpartidários, locais, familiares e de casta. Aceites na "família", beneficiamos da solidariedade do "sangue", tornamo-nos impunes.
Constâncio retrata na perfeição como as unidades orgânicas do Estado funcionam sem efectiva avaliação e regulação externas. As "famílias" que nos governam tornam-se autocráticas e fogem da acribia como o diabo da cruz.
Entretanto, o povo volta as costas ao castelo e nem percebe que nem o chão que pisa é seu. Por isso, ou entra para uma "família" ou é extinto...
A resignação e a abstenção nunca foram boa companhia. É preciso ser cada vez mais exigente com quem não tem pejo em parecer "ingénuo" e, ao mesmo tempo, recorre ao ataque soez...

13.6.09

Sem sair do país de Sócrates...

Na barragem do Maranhão, este sábado traz-me ao pensamento (à falsa memória) os impressionistas que trocavam Paris pelos recantos bucólicos dos rios e dos lagos franceses. Alheados da realidade envolvente, acampavam sobre relvados viçosos e penhascos erotizados Ao fim da tarde, regressavam taciturnos e mais obesos, mas disso não reza a pintura do século XIX. Hoje, não vi nem pintor nem paleta, vi apenas quadros, em alguns casos, cenas do quotidiano que sintomaticamente completavam o filme que vi ontem "Almoço de 15 de Agosto".
O argumento não era muito diferente. Só mudava o cenário e alguns detalhes (franceses!): os velhos satisfaziam o desejo de ser bons anfitriões desde que os não contrariassem; o filho já perdera pai e mãe (sorte a nossa!), ouvia-os atentamente e servia-os sob o toldo da autocaravana.
De política, não se ouviu falar. Apenas, o Correio da Manhã derramado sobre uma mesa de café. Rádio e televisão só com recurso a parabólica. Supermercado de stock esgotado. Piscina seca apesar da canícula. De diferente, as formigas pretas e enormes que insistem em trepar corpos desnudos... e, em particular, uma lição de lavagem de loiça divina... Quando um homem decide ensinar outro homem!

11.6.09

No país de Sócrates…


Sócrates: «Sempre pensei que os oradores e os sofistas são os únicos que não têm direito a censurar aqueles que educam pelo facto de estes serem maus para eles, porque, acusando-os, se acusam a si próprios de não lhes ter prestado os serviços que dizem ter prestado. Não será assim?», Platão, Górgias
As celebrações do 10 de Junho voltaram a servir para acusar os portugueses de descrença e de indiferença, na linguagem simples de Platão, de serem maus portugueses. Nem todos que também há bons portugueses, embora quase sempre aposentados! Certamente que os condecorados pertencem ao escol da Pátria: ex-ministros, militares ilustres, professores universitários, de preferência catedráticos, um outro artista mais ou menos desconhecido do povo, vários empresários, um capelão – no essencial, representantes de corporações e de minorias esclarecidas.
Desta vez, Cavaco assumiu que os políticos são maus portugueses e, ao mesmo tempo, saltou fora da barcaça, apresentando-se limpo de qualquer mau serviço prestado à Pátria. Preferiu deixar o recado que também ele merece ser condecorado, ele que insiste em insinuar na praça pública o que deveria debater em privado com Sócrates e Gama.
Do passado brota o bem, do presente jorra o mal.
António Barreto, por seu lado, exortou-nos, qual heterónimo pessoano, a descobrir bons exemplos já não no passado mas, sim, no presente! Creio, no entanto, que a emoção de participar no evento o impediu de ver a bandeja de condecorados servida pelo presidente. Todos bons exemplos! O orador bem poderia ter aproveitado para contar a história de alguns dos agraciados.
Há muito que nos contam "estórias" de proveito e exemplo e Barreto esteve próximo, mas falhou o momento.