31.5.16

Bem podíamos mandar eliminar o luar!

Disseram-me um destes dias que "Felizmente Há Luar!"não era nenhuma obra-prima, como se uma peça de teatro nascesse para ser prima-dona.
Surpreendido, procurei explicar que, em 1961, Luís Sttau Monteiro tinha como objetivo contribuir para uma mudança política que pusesse cobro a um regime caduco, que enviava para as cadeias todos os que lutavam contra a ditadura, contra a guerra colonial, contra a censura, contra o obscurantismo, embora ciente da dificuldade do empreendimento: 
SOUSA FALCÃO: Mas como, Matilde? Como é que se pode lutar contra a noite? 

Em 1961, o próprio dia se transformava em noite para aqueles que eram citados como opositores do regime:
SOUSA FALCÃO: Ao chegar a S. Julião da Barra, meteram-no logo numa masmorra e aí ficou todo o dia, às escuras, até que, ao cair da noite, uns oficiais lhe mandaram uma enxerga e duas mantas por piedade... {Gomes Freire d'Andrade)

Não era preciso ser opositor! Bastava uma denúncia! A ditadura não sobrevive sem inimigo e, como tal, se não houver, inventa-se...
Apetecia-me falar do luar, mas para quê? É óbvio, o luar foi inventado para iluminar a noite. Agora que a iluminação pública não nos falta, bem podíamos mandar eliminar o luar...
Afinal, o luar também não é uma obra-prima! 
De qualquer modo, arrisco e vou transcrever duas sequências significativas desta peça de Luís de Sttau Monteiro:
A - D. MIGUEL FORJAZ (com raiva): É verdade que a execução se prolongará pela noite, mas felizmente há luar...
B - MATILDE (Para o Povo): Olhem bem! Limpem os olhos no clarão daquela fogueira e abram as almas ao que ela nos ensina! Até a noite foi feita para que a vísseis até ao fim... (Pausa) Felizmente - Felizmente há luar!

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