1.9.08

O que nos resta?

A cada hora se muda não só a hora / Mas o que se crê nela, e a vida passa / Entre viver e ser. Ricardo Reis

Apesar do homem ter inventado a roda e do seu fascínio pelas formas ovais e arredondadas, o círculo é-nos proibido. Inventámos o eterno retorno, a ressurreição, a transmigração, a imortalidade para, depois, nos deixarmos cair no desespero da recta infinita ou que, pelo menos, se perde no fio do nosso horizonte, porque mesmo esse se revela intangível...

Perante o absurdo da morte, que mais nos poderia Ricardo Reis aconselhar? E nessa linha invisível se situou António Lobo Antunes, ao escrever o romance "Que Farei Quando Tudo Arder?"  Nele, o autor estica o fio da vida, regista o quotidiano das vozes inúmeras que habitam a cidade e arredores, e transcreve minuciosamente essa sinfonia que só os ouvidos de um desesperado podem captar... a linha contínua das vozes travestidas obriga-nos a ocupar esse espaço que se situa entre o viver e o ser, de tal modo que ou não sobra tempo para mais nada ou desistimos de o ler..., desistindo um pouco mais vida...

E se continuar por esta linha, pouco falta para mergulhar no velho Sá de Miranda. Quem diria?

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