13.7.06

Numa nuvem de poalha...

Desde 1998 que me habituei a observar, logo de manhã cedo, um casal de melros, que saltitavam, indiferentes a quem entrava no vetusto edifício desenhado pelo arquitecto Ventura Terra. Não creio que o casal fosse sempre o mesmo, mas estou certo que a atitude, essa, era (e é) a mesma.
Surpreendentemente, surgiu uma outra ave, de bico forte e curvo, nem sempre negra, mas predadora, que começou a reproduzir-se, de forma intensiva, gerando um bando omnívoro que emite estrategicamente sinais de inteligência, planeamento e comunicação...
Já esta semana, uma dessas experimentadas criaturas sofistas, num golpe de mestre, teve a audácia de se assenhorear do labor de alguns pequenos invertebrados que por ali restam.
( Relembro que o cada vez mais desacreditado S. Freud já explicou que 'um golpe' não é mais do que a repetição do 'golpe original'. Por isso, talvez, ainda valha a pena criar uma «área projecto« cuja única meta estratégica será descobrir o primeiro golpista.)
Mas o mais grave é que esta endémica holopatia alastra das galerias, ladeia os pátios norte e sul, na expectativa de destronar, em 2008 , o arquitecto Ventura Terra.
A entronização decorrerá nas caves e, nesse dia, numa nuvem de poalha, estarão presentes todos os ilustríssimos avoengos de bico forte e curvo, já quase todos negros...
Resta-me, porém, a esperança ( historicamente infundada!) de que não havendo mais presas, o bando levante voo, de vez...

1 comentário:

  1. Como entendo o voo rasante e a teimosia e a esperteza de certas aves!
    Em Estrasburgo, quando era inverno e havia muita neve na cidade, ficava deslumbrado com a quantidade de corvos grandes, enormes, do tamanho quase de galinhas, que parecia saltitar naquele branco infindo. Era um contraste lindo, um quadro belo que me habituei a admirar, sossegadamente a uma distância próxima, entre o ruído e a azáfama de uma urbe ordeira. Era, contudo, um contraste sadio, consentido, bem intencionado. Aprendi nessa minha longa permanência alsaciana a respeitar os corvos... Aves quase humanas, numa convivência diária, de meses seguidos, olhando-nos distraidamente, e nós a elas, em esgares pacíficos, nada ameaçadores.
    E depois, mais tarde, regressados a casa, damo-nos conta que os pássaros, mesmo sendo da mesma cor, de negro vestidos, como ambos são, corvos e melros, podem muito bem ser diferentes, muito diferentes.
    E se de corvos pouco mais sei do que aquilo que por lá contemplativamente pude apre(e)nder com os olhos e com o coração, de melros nada sei, destes melros que por cá sofisticamente deambulam entre arcadas, árvores e caves. Desta espécie de praga cada vez sei menos, a não ser que existe, e que resiste.
    E a solução não passará por armadilhas à vista como as que estrategicamente se encontram nos postigos de ventilação das caves que esse tal Ventura Terra desenhara para esse fim, para ventilar, e não para desratizar, como também agora servem.
    E é pena, porque, sendo melros, têm igualmente muito de ratos...
    Mas a alegoria é o que é, e atrás de melros, melros virão, uma vez mais como os ratos.
    Os demais invertebrados que se cuidem! Eu, pelo sim pelo não, vou-me vacinando... É que nunca se sabe!

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