8.7.17

Os inenarráveis professores de António Lobo Antunes

Santiago de Compostela, Parque Alameda
Não foi aqui me sentei a ler a revista Visão nº 1270, mas bem poderia ter sido. A Crónica de António Lobo Antunes merecia essa atenção: «Eu fiz o ensino secundário num estabelecimento chamado Liceu Camões que ainda hoje acho o mais pavoroso e sinistro local que frequentei na vida. Os professores eram inenarráveis.» in O Liceu Camões

Não sei se a memória recria positiva ou negativamente o passado. O que sei é que há um número significativo de antigos alunos que testemunham uma vida académica feliz, mas também há um sem número que cala o tempo que passou no Liceu Camões. Quanto a António Lobo Antunes, esse não perde oportunidade para zurzir a classe docente da época, para mostrar a influência do compadrio e do provincianismo (do Estado Novo) que matava a alma dos adolescentes portugueses.
Provavelmente, o psiquiatra António Lobo Antunes ainda não confessou ao escritor tudo o que de verdadeiramente se terá passado no Liceu Camões.
Por mim, ainda espero que volte a entrar no velho estabelecimento e que oiça o que os atuais alunos têm a dizer dos seus «inenarráveis professores».

7.7.17

O GPS é coisa que eu não entendo

Se há coisa que eu não entendo é o GPS - Sistema de Posicionamento Global.
Globalmente, funciona bem, mas quando se trata de resolver, entra facilmente em colapso. Por exemplo, hoje revelou-se incapaz de me fazer chegar à Avenida de San Lázaro, em Santiago de Compostela. Não reconhecia nem a Avenida nem o Hotel...
Esfalfado, lá me vi obrigado a consultar um taxista e depois um ancião que se revelou bastante conhecedor do lugar.
Daqui os saúdo a pensar no falhanço do SIRESP, pois me parece que esta nova tecnologia, apesar de todo o software, ainda não consegue suplantar a experiência humana...
Esta coisa das máquinas poderem determinar o futuro da humanidade perturba-me, até porque estou convencido de que muitas já estão programadas para decretar a falência ou a destruição de um país...
O problema é que anda por aí muito ser humano que não se importa de ser conduzido pelos novos androides.

6.7.17

O olhar

O olhar é uma via que leva tanto ao saber verdadeiro, a um nível informativo, como ao erro, tanto informativo como formulativo. Luís Filipe Barreto, Portugal Mensageiro do Mundo Renascentista, Pág.36, Quetzal editores

Apanhei o autocarro 783 com a ideia de aproveitar o tempo de viagem para avançar na leitura, mas rapidamente desisti. A necessidade de fixar o olhar dissuadiu-me, pois, com alguma frequência, surge uma neblina enfadonha. Limitei-me a olhar as ruas, as casas e os jardins que as ladeiam, apenas com o propósito de verificar se a memória correspondia ou se necessitava de a reformular... De facto, tudo se repetia até que a modorra tomou conta da situação...
Chegado ao Marquês de Pombal, reabri os olhos, pois a memória dizia-me que era necessário estar atento às passadeiras, à lentidão dos semáforos, sem esquecer as novas ciclovias... O olhar foi descodificando os avanços e recuos, ao mesmo tempo que se prendia nas famílias estrangeiras que, desorientadas, lá iam subindo e descendo a Avenida, pasmadas para o luxo das boutiques laterais...
Até que chegado ao nº 202, entrei e me sentei à espera, reiniciando finalmente a leitura que ensina que o olhar não é só fonte de saber, é também fonte de erro... o que me permite, agora, pensar naqueles jovens que fazem fé no olhar de Alberto Caeiro, como se ele fosse divino e que repetem, à exaustão, que ele é o poeta das sensações, e que acriticamente seguem o seu caminho, longe do pensamento...

5.7.17

Se o SIRES(P) é de Portugal, como é que pode ser privado?

SIRESP: Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal

Se o SIRES(P) é de Portugal, como é que pode ser privado?
O problema tem origem em mais uma parceria público privada (PPV). Os bancos financiam, a fundo perdido, o Governo delega a sua responsabilidade em troca da colocação de uns tantos apóstolos, e os privados (os mesmos apóstolos) enchem os bolsos enquanto o negócio não se afunda... Quanto ao contribuinte, esse sofre as consequências da negociata, como se tem verificado...
Se o sistema é integrado, as redes de emergência e segurança que o constituem devem estar devidamente conectadas... sem estar à espera que, por milagre, numa situação de crise, surja um ator capaz de resolver as falhas das múltiplas redes, habituadas a viver sozinhas para proteger os respetivos interesses...
Por mim, este SIRES de que se fala não é de Portugal, a não ser pelo facto de não se diferenciar das restantes PPVs... Portugal é o país das PPVs porque continua a haver quem queira aproveitar-se da saloiice nacional.
A verdade é que a própria Assembleia da República não passa de uma PPV!

4.7.17

O professor e comentador Medina Carreira

Faleceu ontem.
Durante anos, comentou o estado da nação, revelando um país que vivia acima das suas possibilidades e, sobretudo, zurzindo a classe política (e seus apaniguados) que, para além de incompetente, era claramente corrupta.
Fê-lo com recurso a um método, por vezes, anacrónico e enfadonho, mas porfiou sempre, alertando para o peso da dívida e seus efeitos a médio e a longo prazo no tecido social...
Hoje, a hipocrisia assentou arraiais e o homem que, ontem, era objeto de chacota e de desprezo virou santo.

3.7.17

Se nada disser


Se nada disser é porque estou a desfiar as contas de um rosário que não é meu. É lenta a desfiadura, pois é necessário voltar atrás e verificar a sintaxe, que anda pelas ruas da amargura... 
Se não fosse a música, pensaria que as oliveiras não se sentem bem com o cheiro magrebino que se eleva do Tejo... 
Se nada disser é porque não consigo entender como é que um furgão terá entrado no perímetro militar de Tancos e terá esvaziado os paióis...
Se nada disser é porque não quero pronunciar-me sobre os fanicos dos políticos que não compreendem as razões dos incêndios, dos desfalques, dos assaltos, da falta de coordenação...

1.7.17

A imagem que elimina o tempo

Revolvemos gavetas e baús, à procura de brinquedos e de fotografias.
Procuramos, entre milhares de fotos, no álbum ou na pasta digitalizada, a imagem que, repentinamente veio à memória...
           elimina o tempo... e sobretudo, faz do lar um espaço seguro, um espaço singular onde ninguém mais pode penetrar... E este ninguém, se insistir em bater à porta, arrisca-se a ser visto como intruso no interior da própria casa...
Este tipo de fobia pode ser ainda mais incontrolável do que aquela que explode quando as ruas e as praças da cidade se enchem de estranhos de todos os tipos, porque nas ruas e praças todos somos outros, inexplicáveis e ameaçadores...
Descontrolados, corremos para casa e fechamo-nos... nos computadores, nos álbuns.
Corremos as cortinas. Confortáveis, voltamos a revolver as gavetas à procura de imagens, enquanto o outro se dilui...