16.2.10

O Tejo

 Nas estradas do passado, há uma que, a espaços, reaparece. O Tejo. Ultimamente, vem ocupando cada vez mais espaço. Aqui, em Alhandra, em dia chuvoso de Carnaval, o Tejo corre cinzento, cor de cimento… pronto a mudar de mãos com o consequente empobrecimento das populações ribeirinhas, já de si tão abandonadas. Os sinais de decadência estão à vista. Basta olhar as casas em ruína, a sinuosidade das vielas. Nem Deus se mostra disponível, tão íngreme é a escadaria! 
O Tejo devia ser uma via nobre e estruturante do nosso crescimento; pelo contrário, arrasta-se ora tímido ora revoltado sob o olhar indiferente dos governantes que só se lembram dele para construir mais uma via rápida, como se ele não passasse de um escolho... 

14.2.10

Caminhos II

De cima, não avisto o lugar onde outrora subia a estrada que se perdia na curva dos moinhos. Olhava a serra próxima que matava o horizonte; uma encosta, em labareda, cegava-me a vida. Se virava à esquerda, percorria dois, três kilómetros, e regressava à origem. Durante anos, a estrada orientou-me para a direita, levando-me a outro castelo, cujas muralhas se tornaram confidentes, muralhas fernandinas, outrora testemunhas da barbárie de D. Pedro I, ali, na janela do Condestável, em nome de amores proibidos ou imaginados…, também eu fui atirado à vida por insuficiente fé.
De regresso à origem, sem consciência da minha vizinhança com Pedro Álvares Cabral, jazente na Graça, deixei de virar à esquerda ou à direita, e passei a caminhar em frente, desembocando nas margens do Nabão, donde, na encosta, observava o Convento de Cristo, como se este ali estivesse para me obrigar a reflectir sobre a fé que nunca compreendera…
À esquerda, à direita, ao centro… sempre o castelo e a encosta que me cegavam a vida. E lá longe, lá em cima, ficam África e o Brasil… e eu continuo aqui em baixo. Sem fé em Deus e nos homens. Até quando? Só os caminhos continuam a levar-me…

13.2.10

Caminhos de Ourém

Do terramoto de 1755, sobrou apenas o túmulo do IV conde de Ourém, neto de Nuno Álvares Pereira e de D.João I. No entanto, logo no reinado de D. José, este mandou reconstruir castelo e igreja. 

Castelo, túmulo e pelourinho evidenciam a riqueza herdada de D. Nuno Álvares, senhor quase absoluto do território, em paga do seu patriotismo, entre 1380 e 1385. O seu neto viaja  para terras de Sabóia e de Itália e consigo traz o estilo italiano, visível no castelo e pelourinho ( a águia de Sabóia).

A abertura à Europa, começou cedo, apesar de, quase simultaneamente, lhe termos voltado as costas. A sombra de Espanha atirou-nos ao Atlântico e, logo que nos distraímos, lançou-nos nos braços dos jesuítas.

/MCG

11.2.10

Preocupante

Vivemos um tempo em que todos temos opinião sem sentirmos necessidade de a fundamentar. Deixámos de procurar e ponderar argumentos. Os bons e os maus exemplos da História não nos interessam minimamente. Acreditamos piamente nos nossos caprichos e desvalorizamos por inteiro o estudo e o trabalho. A paródia tornou-se o género predilecto.

Ora, como bem sabemos, a paródia sempre recorreu à manipulação dos dados e ao empastelamento da informação. Em Portugal,  a paródia é um género antigo e temível. Actua à sombra da liberdade de expressão e não resiste a censurar ou até em liquidar o alvo.

Paradoxalmente, a paródia está a matar a caricatura.

6.2.10

Destroços em Escaroupim

  

Em ESCAROUPIM, o barco era o berço, a câmara nupcial, a oficina e a tumba para os AVIEIROS, oriundos de VIEIRA DE LEIRIA. Em Junho/Julho de 2005, passei por aqui. A estrada melhorou, o restante estagnou. Em tempo de profunda crise, o Tejo corre lamacento; as mulheres, ao sol, conversam ; o homens escondem-se na cantina / centro cultural dos avieiros.

E eu, vou pensando que, um dia, talvez, um Governo decida criar um programa nacional de cultivo de 20% dos campos deste país… Se isso acontecesse, quantos desempregados encontrariam um rumo?

E se limpássemos as margens e  os pegos dos rios? E se reflorestássemos, montes e vales? E se recuperássemos o património?

Será assim tão dispendioso e difícil criar um projecto nacional que aproveite a mão-de-obra disponível?

2.2.10

Rendilhado…

  A poucos metros de distância, a solidez da cor esmaga cúpulas de outrora; a delicada renda aberta liberta o verde da copa… E eu descanso o olhar num mergulho ascensional que me deveria afastar do labirinto em que me deixei enclausurar. Aqui, as regras ficam para trás; o rumor esfuma-se; apenas, sobram resquícios amorosos de livre arbítrio …

(O resto é desencanto, alheamento… enorme maçada.)

30.1.10

Para além do futuro…

 Há o perto e há o longe. Do presente, apenas a proximidade onde se esconde o cemitério anunciado pela forma esguia e gótica – sensações de ausências por explicar. Do passado, seis moinhos perfilados testemunham os destinos breves e desprendidos; ao mesmo tempo, trazem de regresso o atalho e o tojo, o burro e a saca, o moleiro e a mó – farinha e farelo da existência.

Fica a bifurcação, onde, por enquanto, nada passa e que eu percorro só de a olhar.