31.3.17

O milagre de Costa

Assegura o chefe do Governo que está “afastado o espectro da liquidação” do banco e que a venda terá “impacto positivo na estabilidade do sistema financeiro”, e ainda que “não serão exigidas contribuições extraordinárias” para suportar a alienação do Novo Banco.

Como não sou crente, a declaração de António Costa vale zero. Há muito que o país está em liquidação e só quando se diluir numa outra qualquer realidade é que o problema deixará de existir. 
Nunca tivemos capacidade de autossustentação. Fomos e somos o produto de contingências que não controlamos...
Não é apenas o Poeta que é um fingidor, somos todos nós!
Bem sei que o Papa Francisco vem aí celebrar o milagre de Fátima, mas a verdade é que continuamos a fingir. Sempre ouvi dizer que a Senhora viera para que rezássemos para que o Comunismo não alastrasse à terra da cristandade...
Os tempos vão tão confusos que se a Senhora decidisse voltar, provavelmente limitar-se ia a solicitar que rezássemos contra os vendilhões...  

30.3.17

Mais poeira no Ministério da Educação

  • Defendemos uma orientação pedagógica estável e, por isso, estamos a tentar que a educação comece dos zero aos três anos.
  • Investir nos adultos é investir nas crianças.
  • Tentar agir aos primeiros sinais de insucesso, prevenindo o fracasso escolar;
  • Aulas de apoio são um caro insucesso. O aluno fica exausto da mesma forma de jornada de trabalho.
  • Queremos investir 19 milhões de euros em formação de Relevância, Qualidade e Impacto.
      João Costa, Secretário de Estado da Educação
- Dos zero aos três anos? Será que o Estado (espartano) quer substituir os pais?
- Afinal, o Programa Qualifica tem como objetivo formar os pais como educadores? Mas, para quê, se o Estado se quer ocupar da educação dos bebés?
- O insucesso é fruto da falta de enquadramento pedagógico e do modo como o Estado insiste em não promover, de forma diferenciada, a resolução das dificuldades de aprendizagem de cada jovem, integrando-os em grupos de nível...
- Quanto às "aulas de apoio", estas só beneficiam um número muito diminuto de alunos... E a questão da exaustão é um falso problema, pois trabalha-se pouco e mal, até porque os recursos, em muitas escolas, são obsoletos. 
- O investimento nos professores é, como sempre, um negócio, desta vez em torno de conceitos bélicos: "relevância", "qualidade" e "impacto". A verdade é que o Ministério da Educação abandonou a formação de docentes, deixando-a a cargo de personagens sem qualquer formação pedagógica, sejam eles do Ensino Superior ou mesmo das grandes editoras... Há muito tempo que o ME foi feito refém pelas editoras, como o senhor professor João Costa, bem sabe...

29.3.17

A perceção da realidade

O que dizer?
Se nada disser, parecerá desinteresse ou, no limite, desistência.
Se ensaiar uma resposta, ficará a sensação de que o emudecimento teria sido melhor.

Hoje, perguntaram-me de quanto tempo necessitara para escrever o post "A condição humana". Surpreendido, respondi 30 minutos. E de imediato hesitei, pois me pareceu que o tempo necessário seria muito mais extenso... 
Meti a viola no saco e segui caminho...
O resto do dia apenas serviu para mostrar que o silêncio ter-me-ia evitado a inopinada subida de tensão. O problema é que replico sempre que a perceção da realidade entra em conflito com o estado do mundo.
Entretanto, regressei à pergunta matinal, para concluir que mais valia ter respondido que os 30 minutos de escrita eram, afinal, a expressão de uma vida...  

28.3.17

Ai, a culpa!

Tem que haver sempre um culpado! Alguém que sacode a água do capote, que passa a bola, que alija a carga...
Um vestígio romântico de pária atirado para a margem, abandonado à sorte madrasta...
Apenas um rumor inconfessado de castigar o Outro por tudo o que vai acontecendo. Uma vontade súbita de adormecer e de acordar como se nada se passasse...
Porém, as horas cruéis são de crime!

27.3.17

Um tempo imperfeito

Repete incansavelmente um tempo imperfeito, que correra bem e descambasse a cada momento, mesmo se cada dia mais não fosse do que uma réplica de múltiplos episódios, consequência de ter nascido em dia aziago...
Para lá desse dia, existiria a abundância, embora saiba que o tempo já era de desarmonia.
Só que o saber de nada serve, quando se regressa ao abismo. 

26.3.17

Zona de contacto

Há conceitos que se banalizaram de tal modo que deixaram de ter utilidade. Hoje, não passam de etiquetas que se colocam sobre certas formas de lidar com o Outro. Estou a referir-me aos conceitos de multiculturalidade e de interculturalidade que determinam espaços de acantonamento e de integração, embora diferenciada.
Mary Louise Pratt (1992) propôs que a investigação passasse a centrar-se na «zona de contacto», porque este conceito obriga a equacionar a distância e a proximidade a que nos situamos do Outro.
O problema é que quanto mais nos aproximamos, mais sentimos necessidade de traçar limites. 
Na verdade, quando distantes, não vemos obstáculos à diluição de fronteiras; só que, quando o Outro entre no nosso espaço, surge o medo, o desassossego, a fobia, o ódio... 
Como alternativa, os políticos de esquerda preferem a abordagem exótica, desde que ela traga dividendos.
Quanto aos políticos de direita, preferem levantar muros. Preferem o apartheid, em nome de uma pureza fantasiosa.

25.3.17

Os media e os rituais de morte.

... de tal modo que a imortalidade se tornou alcançável pelos caminhos do ódio e da destruição... in "A condição humana", 24/3/2017.

A ideia é minha, mas peca por excessiva. A imortalidade já não interessa a ninguém! O que conta é o fulgor do momento, o raio que se liberta do trovão e que se precipita fulminante sobre a vítima... E a glória da mediatização é a droga que acelera o coração e entorpece a razão.
Não é islâmica, a faca que degola, é a que mata o suíno num ato de superação da impotência de quem só recobra a honra através do sangradura pública.
Infelizmente, a comunicação social vive e alimenta cada vez mais os rituais de morte.

24.3.17

A condição humana

Ainda não havia tempo, quando duas criaturas bíblicas, que residiam num lugar paradisíaco, desafiaram Deus, sendo desterradas, como o próprio termo sugere, para a Terra, e condenadas a trabalhar, a sofrer e a multiplicar-se.
Foi essa desobediência que gerou a condição humana: as duas criaturas, ao perderam a imortalidade, tornaram-se efémeras, fracas, vulneráveis e, sobretudo, conscientes da sua pequenez.
No entanto, a mudança de estado não lhes destruiu o sentido do desafio. Através da multiplicação e do trabalho, acreditaram ser-lhes possível regressar à casa original, embora o percurso lhes pudesse exigir sacrifícios infindáveis e, em particular, a morte.
Mas nem a morte inexorável os levou ao desespero absoluto, isto é, à renúncia. Pelo contrário, definiram rumos precisos, cuja meta derradeira é a imortalidade, aonde se poderá chegar pela via do heroísmo (herói clássico) ou pela via da santidade (santo)...
E são estas as rotas escolhidas pelo homem para superar a condição humana. Todavia, "incapaz de assistir num só terreno", o homem gasta boa parte do seu tempo a disputar qual das rotas é a verdadeira, de tal modo que a imortalidade se tornou alcançável pelos caminhos do ódio e da destruição...
Talvez seja por isso que os jovens preferem viver num universo paralelo - o paraíso lúdico. Só que lá não deixam de procurar a imortalidade, ao quererem a todo custo superar os jogos com que o Incognito Deo lhes junca as vidas...

Há, contudo, riscos: neste desterro, a multiplicação já é possível sem um verdadeiro empenho dos filhos e das filhas das duas misteriosas criaturas bíblicas, o trabalho humano pode perfeitamente ser realizado por todo o tipo de máquinas... apenas sobra a dor (humana) materializada numa depressão sem fim.

23.3.17

Funcionário público não é filho de Deus!

Funcionário público não é filho de Deus!
Quem tem 48 anos de descontos pode reformar-se sem penalização.

Governo elimina o factor de sustentabilidade para todas as reformas antecipadas.
O novo modelo só se aplica a quem desconta para a Segurança Social. Os funcionários públicos manterão o regime atual.

O melhor é não pensar mais no assunto! Esclarecido para todos os efeitos!

22.3.17

A montante e a jusante do terror

" - O que importa é o que cada um tem na cabeça!" - resposta de um jovem revoltado.

Ao contrário do que se apregoa, o terror não tem origem nem na ideologia nem na doutrina nem na cultura nem na moral. O terror tem origem na necessidade de cada um afirmar a sua presença no mundo de que se sente excluído...
Ao contrário do que se pensa, a escola não inclui. A escola afunila. 
À saída, a escola abre para a terra de nenhures..
E é nessa terra de nenhures que o desespero humano se transforma em horror.
(...)
Entretanto, os comentadores insistem em explicar o terror, atribuindo-o à ideologia/doutrina islâmica, a maquinações satânicas cujo o único objetivo é estender o medo, gerando choques ideológicos, religiosos e culturais propiciadores de eugénicas guerras.  

21.3.17

Os novos cafres

Segundo a edição online do Semanário Económico, a presidência da República portuguesa considera que “é inacreditável e inaceitável” que Vítor Constâncio, atual vice-presidente do BCE, aceite a aplicação de sanções ao país, questionando “o que é que Vítor Constâncio está lá a fazer” .

Há (ou deveria haver) um verbo que dá conta do que acontece a um português quando se muda para os trópicos ou, em alternativa, para instituições de alto gabarito - o português cafrealiza-se.
Outrora, portugueses houve que se deixaram voluntariamente assimilar pelos cafres... o que, em certos casos, me pareceu de bom gosto tal era a selvajaria que florescia no reino...
Hoje, apesar de continuarmos a viver acima das nossas possibilidades - há quem diga que o excesso sempre foi do Estado e das empresas! -, não faltam portugueses que, colocados estrategicamente em altos cargos internacionais, não desprezam a oportunidade de passar a viver de acordo com a bitola dos tempos modernos, esquecendo, de vez, a proveniência.

20.3.17

Aliteração interrompida

A temperatura baixou. As nuvens avolumam-se. A chuva parece que chega amanhã.

Sobe a tensão e a irritação. Turva-se o olhar, até parece que um madeiro se atravessa... Primeiro, avança pela esquerda e, depois, pela direita... O rosto enrubesce e, cambaleante, avança rua acima ou será rua abaixo?
A própria voz emudece e a mão tem instantes em que desobedece... e quando tal acontece já a Primavera é sem regresso...

A gata subiu o teclado, indiferente às flores que vão começar a murchar, e seguiu o seu caminho...

19.3.17

O texto

O texto. Diz. O quê?
Afinal, o texto não diz. 
Para que dissesse, era preciso que os olhos pousassem sobre ele. Descortinassem os parágrafos. 
Cada parágrafo, constituído por frases simples ou complexas. Enunciados...
 ...e que as palavras tivessem um significado preciso e, por vezes, ambíguo, mas não aleatório...
Era preciso que os olhos descortinassem a ordem das palavras e vislumbrassem a disciplina a que são submetidas...
Era preciso que as palavras dissessem o mundo, não o nosso, mas o de quem as ordenou...era preciso que as respeitássemos como representação, literal ou simbólica, ou, apenas, prenúncio...Era necessário que não as flexibilizássemos em demasia, que não as denigrissemos nem as branqueássemos
... nem as ignorássemos
Talvez, o texto pudesse dizer. O quê?
- Logo se veria!

18.3.17

A rendição portuguesa

«Cerca de sete meses antes do fim da guerra, em 30 de Setembro de 1973, os efectivos militares em Angola contavam com 65 992 homens (...) Em 1961, eram 6500 militares...» Rui de Azevedo Teixeira, A Guerra de Angola 1961/1974, Quidnovi.

No século XVI, os padrões já não garantiam a presença portuguesa no mundo. E porquê? Por causa do deficit demográfico... Entretanto, foi-se gerando a ilusão do Império na metrópole, alimentada pelos novos métodos de colonização, assentes na ideia da superioridade moral do cristianismo europeu - uma colonização, no caso português, mitigada, porque, devido ao deficit demográfico, se viu forçada à miscigenação...
            e depois vieram as guerras de prova de ocupação, decorrentes da Conferência de Berlim, e, sobretudo, 'a guerra colonial' como prova de vida do Estado Novo...
Se no terreno, a guerra parecia poder continuar enquanto a Guerra Fria se mantivesse ativa, a verdade é que o esforço de guerra se tornara insuportável... de tal modo que a rendição portuguesa se precipitou.
Nos últimos anos, dilacerados por dentro, insistimos na nossa superioridade moral, por exemplo, em relação a Angola, incapazes de julgar a peste que tudo vem dizimando.

17.3.17

Do que é que têm medo? Será de Platão?

Acusem o homem!
Se tantas foram as vantagens financeiras dos negócios apadrinhados pelo homem, acusem-no de vez!
O Ministério Público sabe certamente onde é que param os milhões de euros ou como é que foram gastos. E também conhece as rotas, pelo que se diz na comunicação social. Será que os milhares de ficheiros produzidos não são suficientes para fundamentar a acusação?
O processo já vai tão carregado que, quando chegar a julgamento, irá ficar parado até que os senhores juízes o leiam. Provavelmente, serão os netos dos atuais magistrados a deliberar, já Sócrates terá optado pela cicuta...
Do que é que têm medo? Será de Platão? 

16.3.17

De regresso ao Paraíso

«Em meados do século XX, presumia-se frequentemente que o secularismo seria a ideologia dominante e que a religião não mais voltaria a desempenhar um papel preponderante na política mundial.» Karen Armstrong, Conseguimos Nós Viver sem o Outro?

Na escola pública, o silêncio sobre as religiões é tão profundo que já não sei o que fazer aos meus jovens interlocutores. Se lhes ensinasse Matemática, provavelmente, a minha angústia não teria razão de ser, mas como, por ora, o meu magistério continua centrado na língua, na cultura, na arte, na literatura, nas vertentes diacrónica e sincrónica, vivo num monólogo interminável, pois o Outro, absolutamente secularizado, nada sabe da referência religiosa, vista de forma identitária ou hostil... e tudo isto num tempo de proximidade e conflitualidade inevitáveis...
E apesar de tal estranheza, os estereótipos continuam a poluir a língua e a reproduzir-se insensatamente nas políticas, nos programas e nos manuais das Ciências, ditas, Humanas, incapazes de abolir a simples ideia de que a superioridade moral de uma qualquer cultura possa continuar a imperar, mesmo se alicerçada na santidade de valores, como tolerância, liberdade de expressão, democracia, separação da Igreja do Estado...
              porque «a modernidade não foi baseada num conjunto de ideias, mas sim numa alteração fundamental que se deu na base económica da sociedade.»  Karen ArmstrongConseguimos Nós Viver sem o Outro?

             Bem pode o Papa Francisco  declarar  que comete "um pecado gravíssimo", quem «retira o emprego" às pessoas para realizar "manobras económicas ou negócios pouco claros", a verdade é que, neste século XXI, a base económica da sociedade está a mudar, precarizando cada vez mais o trabalho humano...
Eu, por mim, já tenho dificuldade em explicar o que possa ser o ´pecado', ainda por cima gravíssimo, embora saiba que a culpa é de Deus... e data do dia em que expulsou os anjos do Paraíso, obrigando-os a sofrer, a trabalhar e a multiplicarem-se, isto é, a serem homens... Afinal, no Paraíso não havia homens!
Pela via secular, estaremos de regresso ao Paraíso e os meus jovens interlocutores estão bem mais perto dele do que podem imaginar.

No essencial, o que eu queria registar é que, em 2009, foi posto à venda um livrinho que talvez nos possa FAZER PENSAR: Podemos Viver Sem o Outro? As possibilidades e os limites da Interculturalidade, Lisboa, Tinta-da-China.

15.3.17

Costa trava flexibilização curricular

Primeiro-ministro deu orientações a Tiago Brandão Rodrigues para não avançar com flexibilização curricular e evitar riscos no arranque do ano letivo, a um mês de eleições. Em setembro, a medida só vai avançar em 50 escolas para o ministro da Educação não perder a face.  

Como todos sabemos, a educação é a prioridade do coração socialista, mas que, de tão entranhada, bem pode ser atirada para longe  do calendário eleitoral... Quanto ao jovem Tiago,  este não irá "perder a face", pois vai poder flexibilizar nas 50 escolas que se manifestarem dispostas a servir 'suas excelências'...

14.3.17

Rabugice minha

As portas vão-se fechando. Das janelas pouco se enxerga. Dos bandos, chovem acusações enquanto se afiam facas...
Ainda se a guerra fosse tão discreta, mas não, a que nos cerca arranca as raízes e esmaga os frutos... Das flores, só as de plástico e mesmo estas, liquefeitas, já não sabem o caminho da foz...
(...)
Ainda andamos à procura do perfil do guerreiro, sem saber que este vive nos templos de todas as religiões, de todas as seitas, de todas as ciências... Só que o guerreiro total não tem perfil - é uma máquina omnívora infernal.
Não levem a mal! Isto deve ser rabugice minha! 

13.3.17

O perfil na terra dos néscios

1. Contorno do rosto de uma pessoa, visto de lado; delineamento de um objeto, visto de um dos lados...
2. Corte que deixa ver a disposição e a natureza das camadas dos terrenos...
3. Escrito breve, em que a traços rápidos se esboça o retrato de uma pessoa.
4. Carácter.
5. Génio
             Dicionário de Português da Porto Editora. 

Creio que os cubistas e os intersecionistas (e outros que ignoro!) já se terão debatido com a parcialidade ( a insuficiência) do perfil. Já lá vão 100 anos!
Espero que, à saída dessa enormidade que é a "escolaridade obrigatória", não aproveitem para seccionar o aluno / cidadão, em democrático e não democrático... isto é, observá-lo de um dos lados, como se a cidadania fosse graduada e segmentável...
Em termos psicológicos, estou ansioso por ver a máscara que os jovens cidadãos vão ter de colocar para poderem ser membros de pleno direito desta engrenagem carnavalesca.
Quanto ao carácter, provavelmente, o programador já o terá desenhado, deixando-o falho de qualquer engenho, por muito genial que possa parecer...

Como se pode imaginar, se há algumas décadas, alguém se tivesse lembrado de traçar o "perfil do aluno à saída do Liceu", não andaríamos hoje às voltas ao Marquês, a tentar apurar se o Espírito Santo é, afinal, uma pomba estúpida ou uma língua de fogo...

12.3.17

Um caso de indisciplina

Volvidas duas (três) semanas de debate em torno de uma questão que, efetivamente, não se coloca, entendeu o Ministério da Educação ser taxativo quanto à questão do Português e Matemática — que não irão sofrer redução horária”. (sic)
Um caso de indisciplina


Efetivamente, a questão não deveria ter sido lançada nos termos em que o foi, até porque o tempo atribuído para a lecionação das disciplinas de Português e de Matemática é manifestamente insuficiente.
A aprendizagem pressupõe tempo de exposição, de consolidação, de correlação e de aplicação em novas circunstâncias. 
A aprendizagem pressupõe o recurso a uma metodologia estável, imune à volubilidade de quem governa e de quem gere...
E já agora, a aprendizagem também pressupõe uma certa dose de honestidade!

10.3.17

Da indisciplina

(Um papagaio indisciplinado soltou-se do penteado da "dona" e decidiu regressar ao Congo...)

Um vizinho entra na loja de pronto-a-comer e, fazendo de conta de que não está lá mais ninguém, compra meio frango assado, porque não lhe vendem um quarto, uma colher de polvo, 50 gramas de batata frita...
Na mesma loja, o e-fatura esclarece que os produtos ali vendidos não devem ser considerados na categoria "restauração", mas "outros serviços"...
(...) 
Entretanto, alguém me pede explicação sobre o que é um "comportamento indisciplinado" numa sala de aula, ao mesmo tempo que me é solicitado que deixe de cumprir a programação para que uma turma possa estar presente numa atividade transdisciplinar(?) - prática corrente, recorrente...

Convencido de que a disciplina serve para poder levar a cabo um programa, uma aula, uma tarefa, um plano de tratamento de saúde, de forma eficaz, vejo-me a braços com atos cada vez mais abusivos de indisciplina.
Por este andar, mais vale acabar com qualquer tipo de regra. Salve-se quem puder, que eu já não tenho cura: a não ser ter paciência, ser tolerante, obedecer e conformar-me com a desfaçatez reinante.

9.3.17

Viver como?

Viver como? Para quê esperar que a razão nos elucide? 
Basta abrir os olhos!
Só que há quem, não sendo invisual, prefira fechá-los...
A noite a seu tempo virá, e nada poderá opor-se-lhe.

8.3.17

Faltam poucos minutos...

Faltam poucos minutos para que termine um dia que mais valia não ter começado. Talvez, amanhã possa ser diferente, mas não acredito...
Ainda há quem pense que "a vida são dois dias" e que melhor que desperdiçá-los será vivê-los... Mas como?

7.3.17

No desconcerto vicentino

Mãe, eu nam me casarei
senam com homem discreto.
E assi vo-lo prometo
ou antes o leixarei.
Que seja homem mal feito,
feo, pobre, sem feição
como tiver discrição,
nam lhe quero mais proveito.
E saiba tanger viola,
e coma eu pão e cebola 
siquer ῦa canteguinha
discreto, feito em farinha
porque isto me degola.
    Inês Pereira


Ao contrário do que se diz, para Inês, o homem discreto não tem de ser cortesão. Aquilo que se lhe exige é que não seja néscio, isto é, alguém que não é capaz de reconhecer a própria ignorância, alguém que incorre em erros que o expõem à troça...
O homem discreto será assim um homem avisado, que tem o sentido da oportunidade, e sesudo, porque sabe ponderar antes de decidir...
Em suma, a prudente Inês começa por rejeitar o néscio Pero Marques, porque ainda não tomara conhecimento da natureza do escudeiro Braz da Mata...
De qualquer modo, no desconcerto vicentino, o mundo surge virado do avesso, e a prudência é uma virtude muito arredia. Quanto mais a sabedoria! 

6.3.17

A prudente Inês Pereira

Não sei se a reflexão filosófica me acalma, no entanto, quando à deriva, atiro-me à etimologia, acabando inevitavelmente na filosofia, matéria de que pouco sei...
A propósito de Inês que desejava um homem 'avisado e discreto', acabei por embarcar numa viagem ao território da 'prudência'. 
Para além da ambiguidade teatral da definição de cada uma das qualidades, surgiu-me a ideia de que a 'desmiolada' Inês era bem mais prudente do que se imaginava, sem que tal impusesse que fosse virtuosa, pois se "quem sabe o que lhe convém e atua em consequência, é prudente.»
De facto, o escudeiro Brás da Mata é o exemplo do homem imprudente que casa sem ter avaliado o património da nubente, e que se vê forçado a agir, com recurso à violência doméstica para guardar o seu tesouro, partindo para terra magrebina, onde acaba morto à paulada...
Por seu turno, Inês Pereira é uma personagem epicurista, no sentido em que a vida vivida lhe dá os meios para atingir o objetivo primordial, isto é, para folgar quanto lhe convém... a prudência é nela uma virtude inteletual, própria da época renascentista, a que o Concílio de Trento iria em breve por cobro...
Talvez valesse a pena debater um pouco o que pensam sobre a matéria ( a relação entre a sabedoria e a prudência), Aristóteles, Epicuro, S. Tomás de Aquino, kant, Shopenhauer... mas para quê?
Espero que me perdoem a maçada!

5.3.17

DESGASTE

Já transcrevi umas centenas de palavras, li também uns milhares, sem contar as que tive que escutar. No entanto, neste primeiro domingo da Quaresma, só uma me ocupa o pensamento: DESGASTE.
Não é que me tenha sido encomendado algum verbete, nem para tal haveria motivo, pois o significado é óbvio, pelo menos numa das aceções: [Figurado] Enfraquecimento; diminuição de força física; sensação de abatimento.

Na realidade, não é tanto a diminuição da força física que me preocupa... mas o desgaste que resulta da soma dos dias pardacentos em que os asnos desprezam os burros...
Talvez o discurso padeça de incoerência, mas não. A natureza dos asnos é diferente. Em tempos, era aristocrática, hoje, apenas burguesa. Quanto aos burros, esses sempre foram a besta de carga preferida da populaça...
Há dias, em que o desgaste me torna um burro intratável, daqueles que, no próximo cruzamento, me vão deitar ao chão... Só me falta escoicear!
Se a incoerência se acentua é porque a um burro, ninguém nega a teimosia. Quanto ao asno, mais avisado e discreto, nunca se sabe.

4.3.17

A fronteira

Disseram-me um destes dias que os jovens não têm ideia do que é uma fronteira. Até os compreendo! Uns simplesmente não viajam. Outros, quando o fazem, apanham o avião...
O problema não está tanto na perceção das linhas que individualizam os territórios, mas, sim, na ignorância de que o mundo ainda é partilhado por culturas diversas que, para se individualizarem, estabelecem padrões que não devem ser desrespeitados.
Não ter ideia do que é uma fronteira é desconhecer regras essenciais à interpretação e à compreensão de tudo o que se move fora do nosso círculo identitário e, em alguns casos, é atentar contra a própria identidade.
Por isso, a fronteira pode ser um espaço apenas simbólico, mas é ela que nos permite descobrir a alteridade.
Não está fácil respeitar a fronteira tantos são os maus exemplos que enchem o nosso quotidiano... E quando tal acontece, a deriva é o que nos resta.

Fantasia camiliana

Por mais que faça, há tanta coisa em que não posso ajudar: abrir a janela, arejar o quarto, esconder os medicamentos, subir a temperatura, vestir-te, levar-te à rua; convencer-te de que vivemos um dia de cada vez, de que nada serve olhar para trás e de que só amanhã saberemos como vai ser...Sobretudo, não posso ajudar a que os outros se submetam à tua vontade...
Podia deixar-te! Mas para quê? O remorso consumir-me-ia, como se tivesse cometido um qualquer crime...
A verdade é que tu não queres abrir a janela, arejar o quarto, que eu te esconda os medicamentos, que te leve à rua; preferes alimentar-te do passado e hipotecar o futuro. Continuas a querer alienar os outros, alienando-te a ti própria...
Quanto a mim, não te importas que viva a teu lado, desde que o faça servilmente.

3.3.17

Os eventos parecem granizo

Nada de consistente, apenas poeira. Ao contrário do granizo, a poeira permanece. Não se sabe por quanto tempo... em todo caso, os eventos  parecem granizo.
Caem sem querer saber do rumo e diluem-se na nulidade das convicções.
(...)
Dizem-me que os saberes chegarão a seu tempo e não tem de ser no tempo de cada um! Agora, é tempo de folgar! 
(...)
No entanto, as ratazanas, ao primeiro sinal de descalabro, fogem para o paraíso fiscal mais longínquo, deixando-nos a pagar o naufrágio. E porquê? Porque nada é consistente, tudo é poeira. 

2.3.17

Falhada a depuração

Hoje, perguntaram-me se as férias foram boas...

Há espaços onde as palavras, por mais que as filtremos, se tornam ineficazes e, em múltiplos casos, agravantes... Filtrar as palavras é uma espécie de alquimia cujo fito é depurá-las, despi-las até que da sua nudez surja alguma melodia...
Infelizmente, falhada a depuração, percebemos que a alternativa era o silêncio, mas essa compreensão chega sempre tarde...
Deve ser por isso que os psiquiatras optam pela anestesia perceptiva e os psicanalistas fizeram voto de silêncio, deixando o paciente a contas consigo próprio...
Outrora, no recôndito das grutas, o silêncio incomodava de tal modo que a palavra jorrava líquida e catárquica...

1.3.17

Homens Bons, de Arturo Pérez-Reverte

Hombres Buenos é o título de um romance histórico espanhol, publicado em 2015, em que o seu autor, Arturo Pérez-Reverte, nos convida para uma viagem às profundezas das contradições morais, ideológicas e sociais do séc. XVIII espanhol e francês.
A tarefa é aparentemente simples, pois se trata de iluminar a Espanha obscurantista, disponibilizando-lhe a Encyclopédie Française, o que exige a viagem árdua dos académicos don Pedro Zárate e don Hermógenes, cuja missão é adquirir em Paris os preciosos e raros 28 volumes da 1º edição... 
As dificuldades sucedem-se ao mesmo tempo que os académicos se descobrem e mergulham num novo universo, guiados pelo abade Bringas - personagem fascinante, arauto da Revolução que se anuncia, mas que poucos anteveem, a começar pelos enciclopedistas, que acreditavam que as Luzes seriam suficientes para por termo ao Antigo Regime.
Este romance é um instrumento precioso para melhor compreender ou revisitar o séc. XVIII, sem esquecer o modo como o autor franqueia a sua oficina de escritor, revelando as diligências necessárias à execução de tão ambicioso projeto.
Ler é, neste caso, uma verdadeira odisseia intelectual...