19.5.15

O Meu Irmão, um romance negro

« E é assim o interior de Portugal: uma imensa mulher feia e viúva fechada à janela do primeiro andar de uma velha casa, esperando sair à rua numa ocasião importante como o enterro do doente que nunca conheceu mas em relação ao qual sente alguma afinidade porque vivia na terra ao lado.» Afonso Reis Cabral, O Meu Irmão, pág. 265, Prémio Leya 2014

O leitor não escapa a um sentimento de tristeza. A incapacidade do irmão mais velho de compreender e aceitar o único verdadeiro prazer de Miguel - estar com Luciana - cresce até a um ponto em que a sanidade mental se esfuma por inteiro, tornando-se inseparável da violência que elimina o único objeto do desejo...
A patologia, neste romance, acaba por ser marca não de Miguel, de Luciana ou de Quim, mas, sim, de quem se considera "normal". 
Parece que este romance  procura exorcizar o lado obscuro do Portugal esclarecido, senhor do seu destino, mas não o consegue, porque a cegueira é o seu pecado original, seja no Tojal, no Porto ou em Lisboa...
Talvez por isso, o Eusebiozinho queirosiano tenha aflorado na página 279:

«As irmãs entregaram-mo semanas depois. Entraram na casa que eu alugara no Porto com ele pela mão, porém ligeiramente atrás como o Euzebiozinho nas saias da mamã.»

PS. Apesar de tudo, em Portugal, nem todas as mulheres são feias e, sobretudo, gordas. Este estereótipo parece-me excessivo.


   

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