8.5.15

A fronteira

«Acabará a música, todos irão aonde têm de ir, corre sossegadamente o rio Caia, de bandeiras não resta um fio, de tambores um rufo, e João Elvas nunca chegará a saber que ouviu Domenico Scarlatti tocando no seu cravo.» José Saramago, Memorial do Convento.

O rio Caia ainda era fronteira no reinado de D. João V, delimitava a fronteira entre Portugal e Espanha na região de Olivença. Em 1815, o Congresso de Viena reconheceu a soberania portuguesa... A 7 de maio de 1817, a Espanha ratificou a Ata Final. No entanto, passados 200 anos, «de bandeiras não resta um fio»...

De facto, nem João Relvas chegou a saber quem acabara de tocar «uma música delgadinha, suavíssima, um tilintar de sininhos de vidro e de prata, um arpejo às vezes rouco, como se a comoção apertasse a garganta da harmonia», nem a nós  interessa essa ou outra fronteira...

Para quem anda tão apressado, a fronteira mais não é do que um obstáculo. Afinal, o mundo é todo igual, dizem uns tantos.

Mas não, o mundo está cada vez mais desigual. Todos os dias se elevam novas fronteiras. Todos os dias se morre nas fronteiras... e nós continuamos a flanar. Mentira, continuamos a deambular!


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