13.6.14

Miguel Rovisco procurava estabelecer analogias...

Agora que as aulas acabaram, os exames se aproximam, o calor abrasa e o futebol escraviza, Caruma vai regressar a velhas páginas de jornais e de revistas com o propósito de (re)parar a ligeireza do tempo vivido. Por outras palavras, com o propósito de volver sobre si própria...
Vamos começar pelo (aprendiz de) dramaturgo,  Miguel Rovisco (1960-1987). Aprendiz porque passou a sua curta existência a interrogar-se, a interrogar o lugar ( Portugal), a ensaiar a escrita de teatro, sem ir ao teatro, mas a ler teatro...
Escrever para o teatro é em Portugal uma arte menor! Ir ao teatro é um pouco como fazer um safari... É caro, mal acomodado e arriscado, por lapso ia escrevendo arricado, neologismo não autorizado...
Em 1988 (Capital, 26 de fevereiro), Tito Lívio, no artigo "Teatro de Rovisco Revisita a História", escreveu:
«Miguel Rovisco era um grande admirador das tragédias de Corneille e de Racine de que o seu teatro acusa claramente a influência ao debruçar-se sobre um tempo passado, ao estabelecer as analogias claras com o presente que vivemos, mostrando o quão pouco se terá evoluído em certos aspectos, nomeadamente  a tíbia industrialização do país e a dependência face ao estrangeiro sob o ponto de vista da importação dos géneros mais fundamentais.»
O crítico, referindo-se à "Trilogia Portuguesa", no D. Maria II, retrata Rovisco como um incipiente carpinteiro teatral, desritmado, atabalhoado e desenhador de personagens alienadas - pobre D. Maria I! Ora essa dificuldade era bem conhecida do aprendiz que, ao contrário de outros, tradutores apressados de tudo quanto era moda anglo-saxónica, batalhava, entre quatro paredes, por escrever em português sobre a questão mental que nos persegue há séculos... Doença coletiva que procurava exorcizar em si e no palco e que acabou por o levar ao suicídio... 
A consciência da imperfeição fê-lo rasgar muitos dos seus textos, porém isso não faz esquecer o caminho: a indagação do presente através do conhecimento do passado, a leitura dos grandes dramaturgos e, sobretudo, a dedicação à escrita até que o texto se autonomize do escrevente...

Para quem goste de papéis antigos, pode procurar Miguel Rovisco no Expresso de 6 de fevereiro de 1988.

Se algum dos meus alunos do 12º ano ler esta prosa, dedico-lhe a citação, pois, afinal, de Camões a Sttau Monteiro, sem esquecer Almeida Garrett, todos os verdadeiros autores vivem para estabelecer analogias... Entendê-las é um objetivo da aprendizagem!


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