31.7.11

Num sábado…

 





Não sei quem mora na cave daquela oliveira de encosta. Um dia destes, acampo debaixo da figueira mais próxima… e espero.

As pereiras, logo que se viram livres do mato que as cercava, decidiram ser o maná das abelhas e das aves. E eu, oportunista, antecipei-me…

Um ponto de fuga explodiu no Museu Oriente para me mostrar que a arte é muito mais do que os meus sentidos costumam alcançar…

O poço resiste ao abandono, lembrando tempos de iniciativa…

28.7.11

A pobreza…

Na cidade, a pobreza é mais grave.

Invisibilidade. Violência. Indigência.

A pobreza na cidade é mais grave do que nos campos, porque é possível escondê-la, dela morrer anonimamente; porque a rejeição e a marginalização despertam naturalmente uma resposta violenta; porque facilmente se cai na indigência, perdendo qualquer sentimento de auto-estima, qualquer traço de humanidade.

Neste cenário, que medidas tomam os governos contra a pobreza nas cidades? Apenas pensam na recapitalização da banca! Como se a banca não fosse uma das causas da desgraça que cai sobre nós!

À pobreza, a banca nada diz. A banca só arrasta para a pobreza…

Um governo que pensa mais na banca do que na invisibilidade, na violência e na indigência dos governados, é porque apenas serve o capital. É um pobre governo!

27.7.11

Exotismos!

Valorizamos facilmente o exótico. As árvores de porte altivo são quase sempre exóticas! Sem elas não teríamos jardins, naturais, tropicais ou outros!

Sem a intervenção estrangeira, Portugal não teria sido fundado nem, ao longo dos séculos, teria conseguido manter a soberania…

Hoje, acreditamos que a TROIKA não deve ser confundida com qualquer cavalo de Tróia…

Finalmente, estamos psicologicamente disponíveis para aceitar  avaliadores exóticos (externos).

Nuno Crato, 6ª feira,  anunciar-nos-á que uma nova TROIKA chegou ao Ministério da Educação. E nós bateremos palmas!

E depois andamos surpreendidos com o despertar violento do nacionalismo, embora pensemos que se trata de uma manifestação de exotismo – finlandês, austríaco… norueguês…

Haja paciência!

24.7.11

Maria Lúcia Lepecki

Pode parecer exagero, mas, com a morte de Maria Lúcia Lepecki, Portugal fica mais pobre. Era uma das poucas pessoas que, neste país, sabia ler e ensinar literatura – portuguesa ou francesa.
Tinha um método e aplicava-o à vista dos seus alunos. Não se apresentava como hermeneuta ou exegeta – era uma leitora metódica e perspicaz, incapaz de desprezar o receptor. Tratava-o com carinho, mesmo quando este se revelava pouco familiarizado com o texto…

Não sei se praticava a áskesis (ascese), mas, desde que a conheci, ainda nos anos 70 na Faculdade de Letras de Lisboa, até ao “encontro” sobre José Cardoso Pires, no Auditório da Esc. Sec. de Camões, sempre a vi como uma mulher virtuosa, no sentido que Diógenes de Sinope atribuía ao termo virtude. 

E para sempre assim ficará!

22.7.11

Carvalhal do Pombo na Literatura…

«Na sua casa da Avenida da Duque de Loulé faleceu o  conceituado capitalista e filantropo Afonso Ruas, natural de Carvalhal do PomboAquilino Ribeiro, O Arcanjo Negro, pág.97 

Em que circunstâncias terá Aquilino Ribeiro conhecido tão ignoto lugarejo?

A que Bajonca (barão da Bajonca papalino ou manuelzinho) se estaria Aquilino a referir ao escrever.«aquele Bajonca, que assim se chama a portela de Carvalhal do Pombo onde a avó, que atiraram à margem, deitou ao mundo aquele que passa por seu pai.» ibidem, pág. 102.

Apesar do desconchavo do mundo ( atentados de Oslo), a Literatura não pára de me surpreender!

20.7.11

Luz e sombra…

 Se as tarefas se amontoam ou a vontade é frágil acaba-se por não conhecer o que está na sombra ou para além da fachada.

Mesmo entrando, se à pressa, as peças da história podem deslumbrar, mas apenas isso.

Do martírio desta Santa Eufémia (porque há outras!) até  este registo crescem as sombras…

e nós, contentes…

e eu, apressado, já nem sei porque comecei…

(É tão cedo e já tão tarde!)

16.7.11

Ao ampliar…

 

Vila do Gerês

O que vemos é diferente do que pensamos ver? Ou será ao contrário?

O instantâneo aprisiona o que escapa ao raciocínio… Ao ampliar, ou filosoficamente perscrutando, através da indagação mais ou menos reflexiva, vemos o que lá estava, mas fora da nossa apreensão.

Incautos, amamos a certeza!

Mas quando a ampliamos, percebemos que deveríamos cultivar a dúvida!

15.7.11

Diferenças…


A árvore dá frutos sem que eu lhe(s) saiba o sabor e o nome…


Colocadas lado a lado, as rochas não conhecem o desespero do fim…


Podiam ser as minhas janelas se eu tivesse alma!


A borboleta cumpre… e eu interrogo-me!

14.7.11

A metamorfose

 

As pedras nuas surgem-nos insensíveis, estéreis; excepcionalmente preciosas. As fronteiras são claras! Só a picareta as pode pulverizar…

No entanto, por aqui, às pedras, no leito do rio, não se lhes vê as raízes, mas a cabeleira é abundante e verdejante, e florescem… só não vou a tempo de lhes saber o fruto.

Se Mia Couto por aqui passasse, inventaria, certamente, a estória do velho que, farto da cidade, se teria lançado ao rio na esperança de lhe descobrir a foz. Este, porém, metamorfoseara-o em pedra vegetal.

Por aqui…

 

fauna_Gerês 005 fauna_Gerês 015
fauna_Gerês 016

«Je suis moi-même la matière de mon livre.» Essais, Montaigne

( André Gouveia, Aquilino Ribeiro, D. João V, Montaigne, Sá de Miranda, António Variações – correspondências inesperadas!)

12.7.11

ALDEIA, Aquilino Ribeiro

Vou dar a leitura de ALDEIA (1946) por terminada. Uma obra difícil de classificar! O autor atribuiu-lhe o subtítulo “Terra, Gente e Bichos”, o que me parece adequado, pois retrata a terra montanhosa e pobre, frequentemente, na perspectiva do caçador, a gente lapuza e improgressiva, ignorante, violenta e néscia, e, finalmente, os bichos solidários, se domésticos, e ameaçadores – os lobos.

O conhecimento da terra, da gente e dos bichos é genuíno. O autor inquiriu de tal modo cada um dos temas que a nomeação e a qualificação se revelam terminologicamente precisos e sistémicos, obrigando o leitor a um efectivo esforço metalinguístico.

O ponto de vista de quem – supostamente influente – abandona o Chiado para mergulhar na serra da Nave, é implacável para com a Gente da ALDEIA, boa fornecedora de estórias de pedintes, espoliadores, parricidas, salteadores sanguinolentos, mas incapaz de contrariar o atávico mimetismo que faz das serras testemunho de tempos imemoriais. ( Os antropólogos deviam ter a obra de Aquilino Ribeiro como leitura propedêutica!)

São 15 capítulos, ligados pela Terra, que apresentam a origem, as tradições, a força dos elementos, o comunalismo primevo, estórias de torna-viagem, a acção dos caciques e, sobretudo, a miséria de um país que resiste à mudança…

São 15 capítulos cuja leitura é, muitas vezes, lenta porque nos distanciámos das coisas e dos seres, e, sobretudo, porque, ao perdemos a língua das Gentes, ficamos irremediavelmente desenraizados.

11.7.11

Pelas alminhas do Purgatório!

À consideração do ministro Nuno Crato que está a repensar As Novas Oportunidades (e não só!):

Em 1946, in ALDEIA, Aquilino Ribeiro pronunciava-se assim: «As  chamadas Escolas Industriais e Comerciais fabricam uma espécie de bacharéis às grosas. O que se recomenda é que façam artífices, bons e completos operários. Para isso haveria que reformá-las e criar nas cabeças de concelho escolas de arte e ofícios, individuadas conforme a fisionomia económica da região.»

Se o senhor ministro lesse Aquilino, chamava os presidentes das câmaras municipais e começava por  solicitar que lhe caracterizassem o tecido económico de cada região e só depois decidia o que fazer às Novas Oportunidades, aos Cursos Profissionais e outros que tais…

e fugia a sete pés dos famigerados portfólios prenhes de retábulos das alminhas do Purgatório e de mãos postas…

De nada serve querer reformar (poupar) se não se vê um palmo à frente do nariz!

10.7.11

No Gerês

Bernardo Santareno n’ O Judeu, e José Saramago, no Memorial do Convento, dão-nos uma imagem de um D. João V grotesco. Ou será a imagem que é grotesca?

Quando a Literatura se apodera da História em tempo de decadência, corre-se o risco de que a primeira, ao serviço de preconceitos ideológicos, molde de tal forma o imaginário do leitor que este fique incapacitado de interpretar a “realidade”, entendida como o conjunto das coisas, boas ou más…

Vêm estas considerações a propósito da nota solta: Uma capela em honra de Santa Eufémia, foi mandada edificar por D. João V, em 1733, aliás, o monarca que mais se interessou pela termas, construindo um hospital, residência para médico, boticário, capelas e poço para banhos termais.

Por outro lado, pensando ainda no leitor que não consegue distinguir as sensações dos sentimentos, creio que o melhor é viajar até ao Gerês. Aqui, predominam a cor e o som – as sensações auditivas e as sensações visuais. No lugar onde me encontro, diria que o som da cascata esmaga os verdes da floresta. Quanto ao olfacto, o eucalipto leva a palma ao restante arvoredo, mesmo ao vidoeiro…

Do tacto é melhor não falar, apesar de agora me lembrar que Almeida Garrett não resistia às nervuras das pétalas das rosas, e que Pessoa enamorado da música do romântico e do cérebro de Pascoaes, se atirou às sensações como se a razão nada mais lhe oferecesse como comboio de corda… Afinal, o problema de muitas pessoas é que continuam a criar os seus países, como se lá fora nada existisse!     

9.7.11

À nossa frente…

O sol escasseia. Das aves, não há notícia! A água segue o seu caminho… enquanto a velha senhora espreita os novos vizinhos. Poucos e silenciosos. Alguns regressam ao cair da noite – são belgas e ingleses. Apenas a rádio ‘Fundação” transmite música inglesa, indiferente à presença dos belgas…, embora de hora a hora repita: “à nossa frente só está você!»

/MCG


6.7.11

A causa pública

A um político só fixo o nome a partir do momento em que me convenço que este serve a causa pública. E hoje faleceu uma das poucas mulheres cuja acção política despertou há muito a minha atenção: Maria José Nogueira Pinto. Na minha memória, está agora sentada ao lado de Maria de Lourdes Pintasilgo.

Sempre lhes admirei a convicção e a coerência!

5.7.11

Exemplo…

MOODY'S CORTA 'RATING' DE PORTUGAL PARA 'LIXO'.

Eis um título que, de forma exemplar, dá conta do lugar de Portugal no mundo: o caixote do lixo. Metonimicamente, o “caixote” desaparece para ficar apenas a metáfora em que Portugal soçobra definitivamente. Já nem a língua portuguesa nos salva!

A tirania de agências, como a “moody’s’”, deveria servir para nos questionarmos sobre as nossas opções: ou lutamos por uma república federal europeia ou abandonamos a união europeia e, consequentemente, o euro.

O que não se pode aceitar é que diariamente sejamos humilhados e, sobretudo, devemos combater a política de terror que nos está a ser imposta.

3.7.11

O argumento…

Nas eleições legislativas de 5 de Junho, 85% dos votantes sufragaram a solução dos credores.’ É este o argumento que dá início à ditadura democrática, porque a partir da agora só nos resta pagar e calar. Qualquer desacordo vai ser visto como inoportuno e como causa próxima do falhanço que nos ameaça.

Uns tantos passarão a manifestar-se nas ruas em defesa das “conquistas de Abril”, indiferentes à nova ideologia. Para esta, no entanto, a causa remota, está nessas mesmas conquistas.

Apesar de metade da população não ter votado nas recentes eleições, está aberto o caminho para a gestão do terror porque, aparentemente, 85% dos portugueses apoiam as medidas que os condenam à pobreza.

Em nome da transparência, criam-se e propagam-se falsas evidências. O cilindro da propaganda já está no terreno: abençoam-se os princípios e os objectivos, na expectativa que as estratégias sejam convincentes e os custos diminutos.

No caso das estratégias falharem, resta o recurso à força. ‘85% dos votantes sufragaram a solução dos credores.’    

1.7.11

Nem a sorte nem a magia…

«-Não podemos falhar! Não podemos falhar!» Um enunciado a considerar nas fórmulas mágicas da afirmação de impotência…

Em vez da aposta no trabalho e na contenção, preferimos o esconjuro dos padres da igreja a que nos acolhemos. Quase que apetece gritar que É a hora! mas ficamos por: É o momento!

Fica, todavia, uma dúvida razoável: Não podemos falhar em quê? Para Eça, seria a vida! E para nós, há alguma coisa mais importante do que a vida? Não seria melhor, de uma vez por todas, admitir que falhámos como nação!

Nem a sorte nem a magia nos tirarão do açude em que tombámos, mas talvez pudéssemos aproveitar para criar umas trutas!