29.12.08

Diversas formas de vida

Hoje, ouvi o professor Cavaco Silva com alguma atenção, e percebi a diferença entre o Estado e a Nação... os caravanistas respeitam a Nação e estão-se nas tintas para os Estados, para os superiores interesses..., para a glória futura e imorredoura dos manuais de História. O professor preocupa-se demasiado em assegurar um lugar nos compêndios vindouros. Se discorda da provocação e da incompetência da Assembleia da República, dissolva-a. Para isso foi eleito. Não é elevando o tom que o pastor consegue que as ovelhas regressem ao redil!

28.12.08

Os pastores…

Ao atravessar o Alentejo, vi milhares de ovelhas, carneiros e cordeiros, mas não vi um único pastor.

Para Belém não devem, os pastores, ter partido. Talvez tenham ido até ao Terreiro do Paço…

Por aqui, no Parque de Campismo dos Bancários do Sul e Ilhas (Olhão), só há rolas e centenas de autocaravanistas estrangeiros que se habituaram a passar os rigores do Inverno no Sul da Europa… Alguns só vêem futebol e bebem, bebem…

Estes autocaravanistas, tal como os rebanhos, também parecem viver bem sem pastor…

De qualquer modo, mesmo que queira, não consigo libertar-me dos pastores. Ao longo do dia, lembrei-me dos pastores do Ruy Duarte de Carvalho e mesmo agora continuo a ouvir as piedosas admoestações do Patriarca de Lisboa e, sobretudo, do Papa: o primeiro, preocupado com a guerrilha entre o Ministério da Educação e os professores; o segundo, preocupado com o futuro dos lugares santos…

27.12.08

A prática dos pastores…

/ reis rainhas e donzelas / e muitos por esta estrela / rogam a seu senhor delas / nosso Deos que vá com ela / coma estrela antr’as estrelas // sobre o qual todos pastores / leixam sem pasto as manadas / e se fazem oradores / em oferta dando flores / e suas pobres soldadas. / Gil Vicente, Cortes de Júpiter.

Longe estaria Vicente, em 1521, de imaginar que a prática dos pastores de oferecer os parcos haveres à infanta Dona Beatriz, duquesa de Sabóia, se tornaria moeda corrente nos dias de hoje. Afinal, quem menos tem acaba sempre por saciar a gula dos poderosos e dos manhosos.

Não consta que o ouro, o incenso e a mirra tenham alimentado o menino Jesus, embora a sorte de tais dádiva esteja por esclarecer…

24.12.08

O que fazer com estes fungos?

De facto, não sei como classificar estes fungos! Ao observá-los, fico intranquilo. Evito-os, sabendo que os poderia aniquilar. Mas para quê? Ultimamente, sinto que os fungos se estão apoderar de mim... sopram dentro de mim.

Não sei se estamos à altura!

Sabiamente, o rebanho evita o posto de gasolina. Prefere esperar e passar pelo portão entreaberto, sob o olhar rigoroso do pastor. Ao lado, a tentação, mas o rebanho ignora-a. Como é que o rebanho faz as suas escolhas?
Também nós, em rebanho (ou será matilha ou alcateia?), recebemos a capacidade de escolher entre a sobriedade e o esbanjamento. Não sei se estamos à altura!

17.12.08

O regresso de José Gomes Ferreira...

(Os votantes no Liceu de Camões. Muitos com as listas da oposição disfarçadas nos envelopes do Partido-Que-Vai-Ganhar. Civismo covarde a jogar às escondidas.) José Gomes Ferreira, Grito Plural, 1958

O encontro com José Gomes Ferreira caiu bem. A oradora preparou bem a lição e expô-la com clareza. O recurso a Mário Viegas motivou e, sobretudo, confirmou que, para o Poeta, só a subversão e a ruptura desalinhadas permitiriam instalar o céu na terra.

Uma instalação sublinhada ora pelo encantamento ora pelo cepticismo. O Poeta bem sabia o perigo que corria: para lá da sua janela, os loucos assaltavam os transeuntes e atiravam-nos para debaixo das lagartas das chaimites...

A militância do Poeta é criadora... não serve uma ideia ou um partido. Os poetas alinhados não existem...

E José Gomes Ferreira aprendera a desprezar a mentira!

16.12.08

Numa terra de empatas...

Hoje, acordei com a ideia de que há por aí muitos empatas: médicos, sindicatos,  benfica, oposição...

Ouvimo-los, seguimo-los e, no fim, ficamos quase sempre a perder... Está claro que nem todos perdem. Há sempre uma minoria vencedora...

Por exemplo, no caso dos sindicatos da educação, já se começa a ver quem vai ganhar com a luta...

Eu cá por mim, vou trabalhar enquanto posso!

14.12.08

A serpente da cidade...

A rotina cansa. A novidade alegra. Mas nem sempre!

Nestes últimos tempos, a vertigem da mudança, da racionalização, da inovação trouxeram mais frustração do que euforia. Há quem suspire pelos tempos de mudança lenta, pelas aplicações em escala mínima...

Os tempos são de desassossego face à inconsistência das propostas e aos riscos da sua execução. Tudo leva a crer que a maioria dos líderes se deixa conduzir pelo sentido da oportunidade, descurando o ritmo da mudança e inerente adaptação...

E a dor alastra, alheia à rotina e à novidade..., como a serpente, investe os corpos e arrasa as cidades, pois os campos há muito foram abandonados...

O vento, a chuva (e a neve) estão aí. A rotina outonal! Hoje, o sol seria novidade! A mim, como a tantos outros, falta-me o sol! Sem ele, a esperança e a saúde diminuem...

(Em fundo, os promísquos de longa data proclamam lições de idoneidade e de defesa da causa pública. A demagogia prepara um novo incêndio...)

10.12.08

De Oliveira a Saramago...

O berço os separa, a criatividade serôdia os irmana. Apesar de tudo o que se diz, o cinema de um e a literatura de outro têm mais sucesso fora de portas...

Apesar de tudo, a  longevidade santifica. Por toda a parte, os hagiógrafos entoam laudas, eliminando de uma assentada os restantes criadores...

Quanto aos jovens, chegam indiferentes nas madrugadas cansadas...

5.12.08

Maria e Mário...

O que seria de nós sem eles? De peripécia em peripécia, a peste alastra, arrasa os fundamentos da educação, desacredita-nos irremediavelmente.

Irredutíveis, Mário e Maria disputam palmo a palmo um pedacinho de céu no espelho da fantasia.

3.12.08

Não cedo à pressão...

Afinal, o funcionário público sou eu! Sirvo o Estado e não qualquer governo ou projecto mais ou menos idealista de governo. Infelizmente, a ideia de Estado caiu em desuso e por isso não passo de um funcionário anacrónico e caturra, como diria o poeta José Gomes Ferreira.

Hoje não cedo à pressão, e vou trabalhar com ou sem RTP/SIC/TVI...

1.12.08

Imagens do tempo... no Porto

António Nobre nunca entrou no Majestic!
Será que estou parqueado ou os boémios deram-me volta ao miolo?
O Ramalho Ortigão (1836 -1915) não desgostaria de ver que na Livraria Lello o cliente esporádico é atenciosamente recebido.
Não consegui avistar o Rui Rio! Mas fiquei com a ideia de que a monumentalidade de uma parte da cidade começa a ser valorizada. Ou será que os meus olhos ainda não se libertaram do séc. XIX? Quanto aos desenhos da Graça Morais, acabei por avistá-los na galeria do Jornal de Notícias... mas só abria às 15 horas...

30.11.08

No Porto...



No Porto com muita chuva. Sem GPS por causa do isqueiro avariado. Primeiro, sem mapa e depois com mapa enxarcado... Tudo porque o Star Inn. Low cost design hotel, situado na R. Senhora do Porto, se revelou, quase, inacessível pela Estrada da Circunvalação... uma odisseia a lembrar a pior cegueira retratada por Saramago...
Salvou-se, no sábado, na Casa da Música, o concerto de violino ( Lucia Luque), de violencelo (Andrea Battistoni) e de piano (Sérgio Baietta) que interpretaram Beethoven e, sobretudo, Ravel.
Quanto ao domingo, mais familiarizado com o terreno, fiquei, no entanto, um pouco perplexo com o espectáculo dramático encenado por Igor Gandra "DAYDREAM", com base no conto "As Ruinas Circulares" de Jorge Luís Borges. O texto não passava de pre-texto para preencher 50 minutos pelo Teatro de Ferro. Lá terei de voltar a Borges...
O resto é o que sobra de uma enorme bronquite... e imagens natalícias de ruas com pouco movimento, onde, a espaços, relembro o jardim (romântico) do Palácio de Cristal e os retábulos barrocos da Igreja das Carmelitas, tudo com o sinuoso Douro como moldura...

27.11.08

A democracia e os títeres

Em democracia, convem clarificar se é legítimo ao funcionário público transformar o lugar de trabalho em palco de luta política. No caso dos professores, vale a pena determinar se uma reunião de conselho de turma ou de conselho pedagógico pode dirigir a sua atenção para objectivos que visam abertamente envolver a comunidade escolar no combate político...

Em democracia, é importante  estabelecer se os modelos de avaliação podem ficar reféns dos sindicatos e dos partidos que os tutelam...

Em democracia, importa definir um projecto educativo que consiga conjugar os valores globais com os nacionais.

A balcanização da educação só faz proliferar os títeres.

23.11.08

Onde é que eu estou?

Nas páginas do Expresso nem pensar! O objectivo é simples: deitar a baixo a ministra e, se possível, o Governo. Do Camões, ficámos a saber que a maioria dos professores não é sindicalizada, mas que quer o fim da avaliação. No passado, as alianças estratégicas eram temidas pelos seus efeitos destruidores. Hoje, parece que não. Quem vier a seguir que feche a lagoa!

18.11.08

Da falta de educação...

Uma ministra cada vez mais só, que diz que ouve, mas que, de facto, procura desesperadamente quem ecoe a voz do dono.

Uma conferência de imprensa, no Ministério da Educação (?), em que a Ministra se irrita, qual professor debutante, com os malcriados jornalistas ao serviço de interesses partidários e sindicalistas. Na conferência de imprensa, o clima em nada era diferente do que ocorre em muitas salas de aula deste triste país.

Uma ex-ministra da educação, responsável por muitos dos problemas do sistema educativo, acaba por defender que , talvez não fosse má ideia suspender a democracia por seis meses (Humor negro!). A ministra da educação bem os poderia utilizar para pôr na ordem os desordeiros dos professores. Certamente, um lapso da Drª Manuela Ferreira Leite, dirão os seus sequazes.

Apesar de defender que a actual legislação suporta um modelo de avaliação muito menos oneroso e stressante do que o defendido pelo M.E., começo a pensar que só a queda do ministério permitirá essa alteração. E para isso proponho que se ponha em prática o princípio defendido pelos lobbies que dominam a 5 de Outubro, a 24 de Julho e respectivas direcções regionais: 100% de sucesso escolar.

Basta que, no final do 1º Período, nenhum aluno veja na pauta uma classificação inferior a 10 ou ao nível 3. Se tal acontecesse, o que diria a Nação?

Falta-nos imaginação e sentido de humor!

16.11.08

Até...

Sem querer vasculhar muito no mundo anterior às palavras (o mundo primordial de que falava Vergílio Ferreira) nem precipitar-me no mundo derradeiro, onde as palavras já me não dizem nada, confesso que, ultimamente, tenho vivido algumas experiências traumatizantes: as palavras tornaram-se grilhetas soltas das correntes que nos prendiam ao mundo das coisas, das ideias, dos acontecimentos ( a dimensão da res que dava solidez à vida). As palavras estão cada vez mais desonradas. Vergonhosamente desonradas.

Já não sei como, através da palavra, posso defender a honra das palavras. Ninguém valoriza a palavra dada! É como se as palavras fossem apenas folhas caídas cujo destino seja serem espezinhadas.

Ultimamente, as palavras tornaram-se moedas cujo valor facial é nulo. Nem mesmo quando queremos ensinar a evolução semântica da palavra, encontramos disponibilidade para compreender que sem  o(s) significado (s) diacrónico da palavra, nos é impossível aceder à compreensão do passado.

E isto sem falar daqueles que permanentemente voltam atrás sobre a palavra dada, que aproveitam a indiferença geral para rectificar a imagem e vitimizar o escriba, ou de quem nos quer cobrar a mediocridade da vida. 

13.11.08

Tanta miséria... tanta mentira...

As guerras têm quase sempre início em questões mesquinhas. Raramente, conhecemos os verdadeiros motivos. Inevitavelmente, estende-se à rua. Lá despertam novos líderes cujo primeiro e, por vezes, único objectivo é demolir, servindo-se do inconsciente colectivo.

Desgraçadamente, o inconsciente colectivo não sabe construir. Ou se alguma coisa constrói, fá-lo na mentira e no saque.

Infelizmente, o inconsciente colectivo é um vulcão pronto a entrar em erupção. Mas que se saiba, a lava só se eleva se as plataformas que a acomodam forem desajustadas.

E é nesse desajustamento que reside actualmente a conflitualidade ou o descarrilamento. É um pouco como na Linha do Tua: insiste-se em colocar sofisticado material circulante sobre travessas envelhecidas... Adultera-se o tempo.

O resto é falta de senso! Para quê desperdiçar ovos e tomates com tanta miséria por aí?

9.11.08

Longe das turbas...

De ontem para hoje, aumentou a crispação entre as partes, cada vez mais convencidas de que têm razão. É assim que começam as guerras!

Se não houvesse precipitação, tudo poderia ser resolvido a contento da nação (?), bastava começar por implementar o Decreto-Lei nº 75 / 2008, de 22 de Abril. Seleccionado o director executivo, criados os 4 Departamentos, cujos coordenadores são designados pelo director, estariam criadas as condições para a gestão hierarquizada e empresarial. A avaliação passava a ser tarefa do director e dos 4 coordenadores que, por sua vez, teriam legitimidade para delegar a competência de avaliação, se fosse caso disso. Entretanto, sobrava tempo para formar directores, coordenadores e simplicar os mecanismos de recolha de informação.

Se nada disto acontecer, continuarei céptico. Quem me garante que  os futuros directores, coordenadores e inspectores estarão à altura da missão que os espera? Pela amostra, não vamos lá...

5.11.08

Acudam ao Mestre...

As sensações são as mesmas de 1975. Continua a ser possível fazer a revolução. Para que o eclipse se dê, só é preciso que os interesses de uns se cruzem  momentaneamente com os dos outros. Ganha a batalha, vem o saque...

Ainda, estou a ver o  pagem, a mando do Álvaro Pais, a galopar rijamente pelas vielas obscuras de Lisboa: -"Acudam ao Mestre..."

A lição de Fernão Lopes é das poucas que nunca me sai da memória.

4.11.08

Naïf

A Crónica Contos (d) e realidades, de António Souto, publicada na floresta-do-sul.blogspot.com, consegue libertar-me, por momentos, da última sessão do Conselho Pedagógico, toda ela sobre avaliação ou, talvez melhor, sobre a necessidade de manter viva uma imagem que o espelho há muito deixou de reflectir. Sempre que   alguém me fala de Urbano Tavares Rodrigues, sorrio por instantes.

Sorrio da sua bondade, da sua leveza, da sua crença na fraternidade e na solidariedade, e, sobretudo, do modo como continua a alimentar essa Instituição que poderia ser a Literatura, se esta não tivesse sido colonizada por uma casta de sacerdotes que, pouco a pouco, nos afastam do gosto da leitura...

Pode não ser verdade, mas, para mim, Urbano Tavares Rodrigues é um homem naïf que nunca me pediu nada, e que os deuses decidiram premiar, deixando-o ficar um pouco mais para que o sorriso não vire esgar.

Nestes dias, também eu gostava de ser um pouco naïf, de sublimar as emoções e de olhar com menos rigor as vagas alterosas do deserto que cresce de norte para sul. Ou será ao contrário?

Enfim, de um naïf não se pode esperar que ele tenha a noção de perspectiva!

31.10.08

Uma estranha herança...

Usualmente, as peças movem-se num ritmo lento, ocupando os lugares que lhes são destinados. Tudo parece encaixar: o especialista expõe o fruto da sua longa investigação, e nós ouvimos, deslumbrados...

Na  4ª feira, Aquilino Ribeiro Machado trocou as voltas ao destino. Acordou-nos da modorra, deixou-nos curiosos e sorridentes. Afinal, a cultura ainda desperta os olhares mortiços e suspende  os dedos dos telemóveis.

Basta um alfinete para acordar um piano...

Na 5ª feira, Rita Ferro deslumbrou a plateia, na comodidade e sonoridade da palavra, e deixou Raúl Mesquita, autor de "O Pai e os Outros", à procura de coisas boas e divertidas no Auditório. Será que as encontrou?

Na 6ª feira, Adelaide Canas, no extremo oposto da velha mesa, irmã silenciosa de Aquilino Ribeiro, cercada das altas estantes prenhes de livros desertos, prepara meticulosamente as últimas aulas de uma vida votada a um magistério que, entretanto, perdeu a grandeza que, outrora, regenerava as nações...

E fenecem teclas de piano amotinadas na pirueta de um alfinete...

27.10.08

Pelo pouco que eu vi...

O VI Festival Internacional de Cinema Documental esteve desperto para a crueldade do mundo, fazendo-me recordar os versos de José Gomes FerreiraVai-te, Poesia / Deixa-me ver friamente /a realidade nua /sem ninfas de iludir / ou violinos da lua / Vai-te, Poesia.

E eu só vi:

 ALL White in Barking, de Marc Isaacs, Reino Unido, 2007, que retrata um mundo de preconceitos, fonteiras e xenofobia, à mistura com um ou outro ensaio de aproximação cultural, sob os holofotes do documentarista;

The Tailor, de Óscar Perez, Espanha, 2007, mostra um alfaiate paquistanês, no Raval, em Barcelona, acolitado por um indiano, e que não têm o menor sentido de responsabilidade. Ao paquistanês, só interessam o lucro e a religião. A curta, pelo insólito da relação, do paquistanês com as clientes promove o riso fácil, mas, a mim, deu-me vontade de fugir...

Bab Sebta, de Pedro Pinho e Frederico Lobo, Portugal, 2008, perante o encerramento da porta (fronteira) entre Marrocos e Ceuta, questiona, através de imagens secas e frias, a vida daqueles africanos que tudo fazem para chegar à Europa. A mesma Europa que no passado (e no presente) lhes liquidou as matérias-primas.  Estes africanos, depois de colonizados, foram abandonados à fúria dos elementos, ao despotismo dos novos líderes, à condição de infra-humanos... Um longo documentário que desgasta o espectador. As cidades, na sua profunda miséria, comovem pela vitalidade daqueles que, lá vivem e, sobretudo, que lá se escondem. E do deserto, resta-me o conselho: a única orientação que poderei ter, depois de dormir, é aquela que resulta da capacidade de manter a cabeça voltada para o horizonte que persigo... o resto é morte.

25.10.08

Salvo erro...

«Quando é que foi feita a avaliação de professores? Nunca no passado. Esta é a primeira vez que está a haver. (...) Mas a verdade é que, neste momento, já mais de, salvo erro, 17 mil professores foram avaliados. Desses 17 mil, 7% foram classificados com "muito bom" ou excelente". Uma das coisas que pretendíamos era isto: distinguir o mérito, o esforço, os melhores.» Primeiro-ministro de Portugal, DN, 25 de Outubro de 2008.

Eu até posso concordar com o voluntarismo, mas discordo dos factos.

Primeiro: no passado houve avaliação - os professores submeteram-se, ao longo dos anos, ao modelo aprovado pelos diversos governos de Portugal, antes e depois de 1974. De facto, a maioria dos professores foi sendo classificada com satisfaz, gerando um imobilismo que sempre agradou aos ministros das finanças; apenas uma minoria via ser-lhe a atribuída a classificação de bom, depois de suar as estopinhas, já que era necessário descobrir "testemunhas abonatórias" que só se disponibilizavam se o presidente da Secção de Avaliação tivesse alguns "conhecimentos", em regra, no Ensino Superior. A bonificação, em termos de progressão na carreira docente, dependia da atribuição de 2 bons consecutivos ( de 4/5 em 4/5 anos) ou, então, da conclusão de um mestrado ou de doutoramento, na área de Educação ou de docência. Como é que o Estado distinguiu o esforço dos professores que, pelo esforço e mérito, progrediram mais depressa na carreira? Onde é que eles estão? A fazer o quê?

Segundo: Se a classificação de insuficiente não era atribuída, era porque, de facto, o M. E., descurava por inteiro essa realidade.

Terceiro: Os 17 mil professores foram avaliados. Acredito. Mas como? Será suficiente ser assíduo e cumprir as tarefas atribuídas pelo presidente do Conselho Executivo? Como é que, em 2007/2008, com base nos referidos critérios, os Senhores Presidentes conseguiram distinguir os "bons" dos "muito bons" e dos "excelentes"? E o que é que aconteceu às outras duas menções? A estatística parece ignorá-las?

Quarto:Como é que, até ao momento, foi reconhecido o mérito dos professores "excelentes"? Será que não lhes acontecerá o mesmo que aos "bons" do sistema de avaliação anterior?

Finalmente: Desconfio que está para nos acontecer o mesmo que ao professor Henrique Sapardo de Domingo de Lázaro, de Aquilino Ribeiro:

« O meu amigo reitor continuava no seu posto, eu é que fora rasurado como dispensável. O sicofanta literário, que se emboscara no ministério por trás dum rufador de caixa, assim o decretara. Aquilo era para ele, para os amigos e apaniguados da situação. Depois que regalo para um homem pequeno que se dê conta dele, ainda que seja pelo mal que faz!? Podia lá perder-se a ocasião de ofertar este sacrifício sádico à personalidade?»

24.10.08

O rastilho...

O rastilho já está aceso. As frentes são múltiplas e Sarkosy já avisou os chineses que a presente crise pode hipotecar o futuro da humanidade. O que é que os chineses terão pensado de semelhante aviso?

Por aqui, o futuro é hoje e o amanhã que se lixe!

21.10.08

Uma questão de mãos...

Dá-se com uma mão e tira-se com a outra. Entre o dar e o tirar, cessa a propaganda e morre o projecto. Entretanto, os bolsos de uns tantos vão enchendo, e o país fica de mãos a abanar.

Assim estou eu, de mãos vazias, à espera das sobras que caem da mesa dos ricos. E enquanto espero, não me pronuncio... não vão os esbirros do Pina Manique voltar à rua, em nome da rainha louca, levada em braços para o Brasil, e deixando, para trás, um reino de mãos a abanar.

Mãos cheias, mãos vazias. E eu, obrigado a servir de mãos vazias... Se fosse o único, consideraria essa situação como justa punição, mas não, à volta, uma multidão implora, de mãos vazias... e a esfíngica sécia, nos braços da sua loucura, esbraceja nas ondas atlânticas...

(Do fundo do mar, eleva-se D. Miguel, pronto a casar com a infanta real, não fosse ficar de mãos a abanar.)

20.10.08

In(significantes) delitos...

Passei, hoje, pela nova FNAC do Centro Comercial Vasco da Gama e pude, mais uma vez, confirmar como o mercado editorial se mantém refém de êxitos efémeros e enganadores. Apesar de tudo, pela amostra, parece-me que o catálogo de autores portugueses é mais rico, por exemplo, que o da Bertrand, que, entretanto, mudou de piso. Veja-se o caso de José Cardoso Pires. A Bertrand oferece 2 ou 3 títulos enquanto que a FNAC oferece 6 ou 7. De qualquer modo, nem uma nem outra disponibilizam a peça de teatro "Corpo-delito na Sala de Espelhos", apesar de a Câmara Municipal de Lisboa convidar os alunos do Secundário a ler e a representar aquele texto dramático, datado de 1980, e já levado à cena pelo Teatro Aberto, em 1979.

Embora o assunto mereça um tratamento mais aprofundado, confesso que não compreendo o motivo que leva o Ministério da Educação a considerar como leitura obrigatória "Felizmente Há Luar", de Sttau Monteiro, cujo argumento remete para um tempo longínquo, deitando fora  a oportunidade de colocar o aluno como espectador (participante) de uma História bem mais recente, dramatizada por José Cardoso Pires, ao escrever "Corpo-delito...", a história da tortura interrompida pelo 25 de Abril de 1974, e posterior branqueamento dos cerca de 100.000 agentes e colaboradores do Estado Novo.

17.10.08

Juliette Greco no CCB

Ao ouvir a voz ora máscula ora maviosa  desta criatura, longilínea, e toda vestida de preto, nascida a 7 de Fevereiro de 1927,  penso  na foice que dizima os campos da vida, entoando loas à morte. E a velha dobra-se até aos joelhos num gesto de agradecimento que convida a segui-la pelos caminhos do tempo que não volta mais. Et le temps s'en va... le temps s'évanouit...

A  meia plateia, que rescendia a nostalgia dos anos 50 e 60,  espelha o declíneo da cultura francesa em Portugal.

13.10.08

Gratos...

Perante a notícia de que os sindicatos dos texteis ganham com o encerramento das unidades de produção, ao cobrar 10% das indemnizações e dos subsídios de desemprego, vale a pena recordar que, em 1916, os portugueses (Aquilino Ribeiro, Domingo de Lázaro) se interrogavam sobre a veracidade da seguinte prática: «É verdade que, por cada português, um ministro recebe uma libra?» Entenda-se cada português que chegava ao campo de batalha para combater a Alemanha. Relembre-se que Portugal decretou Guerra à Alemanha a 9 de Março de 1916.

Quantas libras de ouro ganharam, hoje, os governantes portugueses ao entregarem o estado português como garantia aos grandes banqueiros?

11.10.08

A calma destes sobreiros...

Há quem procure a simplicidade...
Eu, mesmo sem caruma, aprecio a pose destes sobreiros de Montargil. Ajudam-me a esquecer as ideias balofas e ridículas que me assombram o quotidiano...
No entanto, a imagem deixa na sombra o trabalhador que, diariamente, expurga a terra dos ramos secos. E a palavra não dá conta da euforia das aves que, ocultas nas ramagens, se preparam para mergulhar na barragem.
Atento, oiço-lhes o canto e procuro-lhes o voo..., mas falta-me a calma dos sobreiros neste sábado outonal.

8.10.08

Torno pública uma explicação privada...

O tema poderia ser a avaliação do desempenho docente e o modo como as organizações a abordam. Mas não é, de todo.

Como diria MIA COUTO, cada professor é uma raça!  Ou ainda como refere Aquilino Ribeiro, em Domingo de Lázaro, ficcionando a sua experiência docente no Liceu Camões, em 1914:

«Se há profissão que fomente a autolatria e a hipertrofia do eu é o magistério. Todos os magistérios. Cada professor é uma filosofia, uma política, uma universidade (...) No ensino secundário, por certo o mais abalizado, que tem os seus dramas de hiperestesia e recalcamento, cada professor pensa por sua cabeça e reage à sua maneira.»

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A liberdade é absoluta. Cada um faz o que entender. Não serei eu a atirar a primeira pedra!

No entanto, mesmo aqueles que declaram que não é necessário uniformizar, dar instruções, acabadas as reuniões, solicitam permanentemente explicações e soluções que não os deixem desemparados na hora da verdade. A maioria dos professores interroga-me, todos os dias, sobre como fazer, como aplicar a lei.

A Lei ainda pesa...

Por isso, tenho vindo a elaborar "ferramentas mínimas" que poderão ser utilizadas ou não, de acordo com a consciência de cada um. E quando as disponibilizo, faço-o para todos..., mas a opção é do avaliado... Só quando dispomos da totalidade da informação é que somos livres na escolha!

Em conclusão,  o meu objectivo é que avaliadores e avaliados conheçam todas as regras do jogo e só isso... Se ajudar tanto melhor! Caso contrário, não será necessário recorrer à Lei para que me retire. Basta que mo digam, no sítio certo.

Manuel Gomes

Estes pensamentos...

A bolha financeira explodiu. Nem podia ser de outro modo. Tudo o que não tem raízes acaba por ser derrubado. Agora, é preciso evitar o pânico.

Também a caruma se encontra à beira da implosão. Começam a faltar-lhe os argumentos para combater a demagogia e o facilitismo.

Os últimos dias têm sido de luta porfiada contra múltiplos espectros, uns sorridentes outros carrancudos, e como é próprio dos espectros, alguns são totalmente invisíveis...

De modo que começo e acabo a pensar em Antero de Quental, António Sérgio e Jorge de Sena. Vá lá saber-se porquê!

De qualquer maneira, estes pensamentos não fazem sentido a esta hora da manhã, quando, lá fora, um autocarro...

(...)

Ainda antes de apanhar o autocarro, lembrei-me que acabava de trair Sá de Miranda, sem esquecer que, aqui ao lado, jaz o romance que obrigou António Lobo Antunes a percorrer os Estados Unidos, promovendo a tradução do romance Que Farei Quando Tudo Arde? - What Can I Do When Everything's on Fire?

Há quantos dias não lhe percorro as labirínticas avenidas! No entanto, o mundo arde... E nós que faremos?

Ai, os títulos! Agora que se anuncia O Arquipélago da Insónia, começo a pensar que, para António Lobo Antunes, o título é mais do que uma coincidência, é o espelho do estado do mundo.

Só lastimo que o escritor, peregrino da escrita e viajante desencantado do mundo, não se atreva a subir a Duque Loulé, atravessando a Praça José Fontana, e após descanso merencórico à sombra do coreto, ouse entrar no Liceu Camões, nem que seja para exorcizar alguns fantasmas que continuam a habitar-lhe a moleirinha... E talvez nos pudesse ler um pouco de Sá de Miranda!

5.10.08

Na Gulbenkian, à volta de Fernando Pessoa

WELTLITERATUR, uma exposição de literatura a não perder. De 30 de Setembro a 4 de Janeiro de 2009. Sob a tutela de Cesário Verde - "Berlim, Madrid, Paris, S. Petersburgo, o Mundo!"-, de Camões a Mário Cesariny, passando por Camilo Pessanha, Ana de Castro Osório,  Teixeira de Pascoaes, Mário Sá-Carneiro, Santa Ritta Pintor, António Botto,  Almada Negreiros, Vitorino Nemésio, Jorge de Sena, Alexandre O'Neill, um fluir de letras, de sons, de imagens, de quadros, de livros abre-se em LIVRO de onze páginas.... que percorro da esquerda para a direita, convidando-nos a (re)LER, não ali, mas naquela Biblioteca que, aos poucos, fomos (ou vamos) construindo...,

mesmo que a Adelaide não nos deixe o jantar "prompto"... Sorte, a de Pessoa!

 

2.10.08

Traduza esta língua, por favor

Alinasa mapo Vaz:

catua patca mta:

isuamu: mpamce

catua sama aluna pama:

trama aluna metama

auna cema pua cato.

uata vata cenia...

25.9.08

Se tudo são troncos, não é sermão, é madeira. (António Vieira)

Um familiar parte, sem deixar nem aviso nem rasto; outro, passados 10 anos, oferece-me a crua imagem do que resta da transitoriedade; um terceiro dá corpo à criancice que há muito deveria ter ultrapassado...; no intervalo, o expediente, a ocultação e a mentira...

Na finança, o jogo e a fraude que corrompem e deprimem os povos...

A Assembleia de Escola foi extinta, mas qual fénix, renasce no dia seguinte sob a forma de Conselho (transitório ou geral)... A Assembleia da República discute a mudança do paradigma do casamento... De futuro, quem é que me poderá impedir de registar definitivamente, no notário, a união das minhas agulhas com o afã do bicho da madeira? De tornar pública esta minha secreta relação?

Entretanto, vou navegando entre A Poesia Trovadoresca, O Sermão da Sexagésima e O Domingo de Lázaro, mas a navegação é lenta; os escolhos surgem a cada braçada sob a forma de signos catacréticos. E de repente, sou interrompido por uma aluna que me interpela, pedindo autorização para trazer um dicionário de casa. Sim, de casa... Quem diria? As palavras atrapalham-lhe a compreensão, ferem-lhe a visão. Ainda não desistiu de ler, ao tropeçar em significantes como "sexagésima", "lázaro", "lazareto", "arrabalde", "mansarda", "águas-furtadas", "coita"...

Espantado, eu que vivo em pleno tempo de preparação penitencial, quase que exclamo: ALELUIA! Mas tenho vergonha. Há muito tempo que o bicho da madeira se esconde por entre a caruma...

20.9.08

Promiscuidade...

As bolsas sobem e descem artificialmente. A riqueza financeira não corresponde a qualquer matéria-prima ou se esta, ainda, existe, é de tal forma manipulada que as populações pagam diariamente os caprichos de jogadores individuais e institucionais sem qualquer tipo de escrúpulo. Assistimos ao esplendor do liberalismo despudorado que, paradoxalmente, continua a ser "almofadado" pelos governos centrais.Só a promiscuidade justifica este modo de agir, numa sociedade que "engavetou a consciência".
A promiscuidade é a causa primeira da morte da alma. E o liberalismo nunca soube o que era a consciência!

14.9.08

Uma leitura diferente...

Estou a ler EL gaucho insufrible, de Roberto Bolaño (1953-2003), da Editorial Anagrama, Barcelona, 2003. Não sei se há alguma tradução em português ou se há por aí quem conheça este escritor, nascido no Chile, mas que retrata de forma extraordinária as vicissitudes recentes do povo argentino e, paralelamente, se revela um singular analista do estado a que a literatura chegou.

JUNO: um filme divertido e que faz pensar...

Fui ver, no Cinema NIMAS, JUNO. O argumento é simples e realista. Muitos adolescentes vivem, cedo, o mesmo drama, embora a carga dramática seja atenuada, pois ressalta a ideia da infantilidade e do desprendimento da jovem grávida ou, a perspectiva de que o erro não deve gerar sentimento de culpa... Talvez seja esta a mensagem para uma sociedade em que os fundamentalismos vão ganhando cada vez mais adeptos que arremessam pedras com a maior das facilidades...

No caso português, creio que este filme bem poderia ser ponto de partida para reflexão de adolescentes e educadores, embora os primeiros provavelmente o considerem demasiado "lento" e até lamechas.

JUNO

13.9.08

A recompensa...

"Aquilo que todos temos,

Partilhamos e preservamos

Poucos sabem o que é…

Mas aqueles que o sabem

Comportam-se como se nunca o tivessem sabido.

Apenas se deixam levar,

Como folhas arrastadas pelo vento."

(M.P.F.)

Hoje, os momentos de desânimo e de cepticismo - foram compensados pela notícia tardia de que a Marisa Peralta Ferreira viu premiados o seu afã, a sua vontade de fazer sempre melhor, a sua disponibilidade para as ciências, mas, também, para as humanidades, sem esquecer a sua jovialidade e a sua humildade. Não sei o que terá sentido ao receber o diploma de conclusão do ensino secundário, acrescido do prémio de 500 euros atribuído pelo M.E., mas tenho uma certeza: por um momento, o seu olhar ter-se-á iluminado e, certamente, terá pensado - "afinal, sempre vale a pena..."

(Infelizmente, como a Marisa bem escreveu no Poema "A Travessia", nem todos sabem aproveitar e partilhar aquilo que todos temos. E quanto a esses, nada posso fazer, mas sobra-me ainda algum tempo para acompanhar os que procuram o caminho da superação...)

6.9.08

Abandonados...

Lisboa, Rossio, 23 h...

Sob as arcadas do Teatro D. Maria II, atordoado pelo som de uma coluna, colocada mesmo ao lado da mesa da improvisada esplanada, observo o movimento de carros apressados e de pessoas que fogem das poças de água que rapidamente surgiram, nesta noite outonal...

Ali, ao lado, uma dúzia de táxis, sobre a calçada saída das Portas de Santão, espera, sem alma, os raros fregueses que se atrevem a circular na Baixa, dita pombalina, mas, agora, já ocupada pelos sem-abrigo que se escondem sob caixotes de cartão... Os que se mantêm de pé, fazem-no de copo na mão, uma derradeira imperial, antes de procurarem outras tascas mais noctívagas... A luz, fraca, por entre a chuva, cria um ambiente fantasmagórico de dúvida e de hesitação...

Na Praça ao lado, dita da Figueira, vá lá saber-se o motivo, os protagonistas não são diferentes, apesar da luz ser ainda mais fraca e do número de sem-abrigo ser superior. Apenas, o acesso ao parque de estacionamento anima um pouco mais o sítio. Estacionado o carro, procura-se a saída, encerrada desde as 22 h.... Por isso, entre as 22 e as 8 horas, promovidos a veículos de duas rodas, seguimos o o caminho dos automóveis, embora o construtor do parque não tenha previsto esta situação... Tudo em nome da segurança!

Perante tudo isto, o que sentimos é uma enorme intranquilidade que, de algum modo, nos faz suspirar pelo Pina Manique ou, então, por uma enorme derrocada que aniquile o cancro que mata o coração de Lisboa. Tal como está, só podemos sentir vergonha... e afligem-me aqueles espanhóis que queriam guardar o carro, em segurança(!?), durante a noite, e perguntavam o preço do parqueamento nocturno. Mas quem quiser saber o preço tem que entrar e, perante a tabela indecifrável, abandonar-se ao acaso...

1.9.08

O que nos resta?

A cada hora se muda não só a hora / Mas o que se crê nela, e a vida passa / Entre viver e ser. Ricardo Reis

Apesar do homem ter inventado a roda e do seu fascínio pelas formas ovais e arredondadas, o círculo é-nos proibido. Inventámos o eterno retorno, a ressurreição, a transmigração, a imortalidade para, depois, nos deixarmos cair no desespero da recta infinita ou que, pelo menos, se perde no fio do nosso horizonte, porque mesmo esse se revela intangível...

Perante o absurdo da morte, que mais nos poderia Ricardo Reis aconselhar? E nessa linha invisível se situou António Lobo Antunes, ao escrever o romance "Que Farei Quando Tudo Arder?"  Nele, o autor estica o fio da vida, regista o quotidiano das vozes inúmeras que habitam a cidade e arredores, e transcreve minuciosamente essa sinfonia que só os ouvidos de um desesperado podem captar... a linha contínua das vozes travestidas obriga-nos a ocupar esse espaço que se situa entre o viver e o ser, de tal modo que ou não sobra tempo para mais nada ou desistimos de o ler..., desistindo um pouco mais vida...

E se continuar por esta linha, pouco falta para mergulhar no velho Sá de Miranda. Quem diria?

28.8.08

Um novo ciclo?

Não sei porquê, mas a expectativa de que o ano escolar que se avizinha seja melhor do que o anterior vai diminuindo à medida que os anos decorrem. Os programas deixaram de me entusiasmar, mesmo que defendam alguns valores que me parecem essenciais à vida em sociedade.

E a questão está precisamente no modo como queremos viver: em sociedade ou cada um por si? Os sinais que recebemos são de facilitismo, desrespeito, egoísmo puro e duro, desrespeito pela vida humana.

A escola inicialmente tinha como objectivo ensinar a viver em sociedade ou, no limite, a servir o Estado. Mesmo este último está competamente desacreditado, incapaz de impor a disciplina, submetido aos interesses de indivíduos e grupos sem qualquer escrúpulo.

E são estes indivíduos e estes grupos sem escrúpulos que se tornaram nos novos heróis que a juventude prefere e, sobretudo, imita cada vez mais.

O ciclo parece-se abrir-se, mas já não há novidade, vontade de aprender, como se tudo estivesse ao alcance da mente..., num tempo em que a mão deixou de a completar...

22.8.08

Fundão

Igreja de Santo António
Para além das marcas da religiosidade provinciana, há por aqui múltiplos traços do Estado Novo. Basta observar a arquitectura: Cafés Aliança, Portugal...o Cineteatro Gardunha. Mas há também o novo riquismo da democracia de Abril. Procure o Mercado Municipal e olhe em redor - uma arquitectura "faraónica". Por outro lado, o capital financeiro também se concentra de forma bem VISÍVEL na avenida principal. Se espreitarmos por detrás das fachadas, a realidade é, no entanto, menos apetecível. As páginas do Jornal do Fundão mostram-nos que as eleições se aproximam e que há equipamentos sociais condenados ao abandono... (Para além de acolher um artigo de agradecimento do medalhado Arnaldo Saraiva que frequentou o Seminário local que um dia visitei e do qual sempre guardei uma imagem de pobreza extrema.) Aliás, o abandono parece ser, também, o destino dos mais idosos, como prova o seguinte episódio. Sentados (eu e minha mulher) a uma mesa da esplanada de um dos cafés mais frequentados, vemo-nos subitamente acompanhados por duas enlutadas senhoras idosas que, cansadas, se sentam e desfiam misérias: abandono, solidão, lágrimas pela incompreensão de um filho, pensamentos suicidas. O empregado de mesa olha-nos com um ar de surpresa e repreensão. Não está acostumado a que os clientes possam ser incomodados... foi preciso tranquilizá-lo, embora me pareça que, de facto, ele não sabia como agir naquela situação. Do que pude ouvir, uma das idosas, mais sorumbática, era acompanhada pela serviços da Santa Casa da Misericórdia, enquanto que a segunda, de lentes garrafais e gordurosas, confessava a uma senhora caridosa (?), de meia idade, que, entretanto, se aproximou da mesa, que não tinha dinheiro para pagar a quem lhe levasse o almoço a casa e fizesse a limpeza. O Anjo da harmonia social lá lhe foi dizendo que não aceitava aquele desespero pecaminoso, que ela tinha direito a uma refeição e a limpeza uma ou duas vezes por semana, que o importante era a papelada...Resolvida essa questão, os dias serão de esperança e não de desespero... E lá fiquei a pensar nas benditas medidas dos engenheiros Guterres e Sócrates que, como no tempo dos faraós, para serem levadas à prática exigem que a miséria ganhe forma de letra. Se o pobre for analfabeto, infoexcluído, então, o melhor (Deus nos livre!) caminho é o suicídio.

21.8.08

Em Cangas de Onis, pelo seu simbolismo...


As imagens dispensam as palavras: a ponte, a cruz, a água, a igreja, Pelágio, a mulher Isabel, as flores... 
(As imagens...)

LEÓN

Uma cidade monumental, cuja arquitectura revela o poder e a riqueza da região. O camping que a serve é fraquinho. O acesso é inconcebível. Mas, enfim, serve... pois dista, apenas, 6 kilómetros do centro da cidade.

20.8.08

Funicular para Bulnes

Um bom negócio: 18 euros e uns cêntimos (ida e volta). Quem quiser poupar uns euros, tem como alternativa um percurso pedestre de 1:30 horas para os mais expeditos e afoitos.
Em Portugal, poderia ser um bom investimento.

Camping Naranjo de Bulnes

Não servem almoços. Só jantares! Fica situado a pouco mais de 1 Km de Arenas de Cabrales. Junto ao rio CARES (omnipresente: poderia ser um narrador de José Saramago. Diga-se, a propósito, que este autor é muito citado na imprensa espanhola. Desconfio que terá mais leitores em Espanha do que em Portugal!) Nos "Servicios", este camping revela-se original... Só vendo… Por outro lado, em dias de chuva, o terreno torna-se alagadiço…

Arenas de Cabrales

Há por aqui muito queijo, mas as cabras e as ovelhas não estão visíveis.Não é preciso procurar muito para descobrir as esplanadas ocupadas pelos seguidores de Baco.
Em Agosto, Arenas de Cabrales é ponto de passagem para o funicular que leva à aldeia de Bulnes. São apenas 6 Km. Mas é preciso partir cedo, para assegurar o estacionamento do camping-car. E o regresso é uma aventura: uma das faixas da estrada desaparece durante kilómetros... E, então, se o condutor continuar sem óculos!

15.8.08

Do rio CARES à Torre FRIERO...

O alvo é registar a confluência entre a água do rio que corre entre penhascos e o cume da montanha que o alimenta. No meio, uma mancha vegetal que esconde o reino animal. Por aqui só passa quem procura despojar-se da vaidade humana.
/MCG

O rio CARES

Para aqui chegar foi preciso subir a bom subir e enquanto se sobe a encosta só pensamos onde o caminho nos pode levar. Quando lá chegamos até podemos pensar que a rocha se torna o obstáculo que interrompe a calma do fluxo e precipita as emoções que provocam a queda da pobre avezinha… De repente, lembrei-me do rouxinol do Bernardim… mas isso já é literatura. E desta, tenho por perto "Que farei quando tudo arde?" do António Lobo Antunes. No entanto, tenho que confessar que as encostas destes montes despertam-me mais emoção que as artísticas metáforas do António...

A simplicidade

Nos momentos de infortúnio, olhar a vida vegetal e animal pode ser uma solução. A expectativa mata o momento e, nestes casos, há que preenchê-lo. Nada melhor que percorrer e observar a natureza. Tudo parece simples, mas o instante em que as asas da borboleta se expõem pode ocupar-nos de tal modo que não há infortúnio que nos ocorra...

14.8.08

Santa Marina de Valdeón, de longe

Para aqui chegar, é necessário querer afastar-se do bulício, querer evitar os engarrafamentos e acreditar que o gasóleo não faltará nem se sofrerá um furo ou, no pior dos casos, um choque frontal... E mesmo assim ainda há dias em que os óculos (as gafas) se quebram e as mercearias não passam de uma miragem... Quanto aos caminhantes de Santiago, são admiráveis quando cumprem efectivamente as promessas que os orientam... A mim, falta-me esse espírito; duas horas de caminhada bastam-me e deixam-me os ossos em pânico...

Camping EL CARÉS


11.8.08

Por terras de Cantábria...

O camping "La Viorna" está situado a 1 Km de Potes, na direcção  do Mosteiro de Santo Toríbio de Liebana (Cantábria..., aliás, hoje, 10 de Agosto, é o dia desta Comunidade!). O antigo mosteiro beneditino vive da "cruz", outrora lugar de suplício e, com a morte de Cristo, tornou-se promessa de vida.

Depois de ter visitado Potes, lugar turístico construído sobre as margens do rio Deva e, pelos vistos, impulsionado pelo marquês de Santillana no séc. XV que, à época, mandou construir a Torre do Infantado, onde provavelmente encerrava os relapsos à justiça que exercia por toda a Liebana,

                                     parti, a pé,  para o Mosteiro de Santo Toríbio, reconstruído nos anos 50/60 do séc. XX, e entregue aos franciscanos. Como não era a (minha) hora, não aproveitei para beijar a cruz de prata dourada, que encerra o lenho original, símbolo da vida. Estou sem saber se Toríbio viveu no séc. V d.C., ou mais tarde, mas parece que terá sido na sua deslocação à Terra Santa que recolheu um pedaço do pau de cedro que suportou a morte de Cristo. O Mosteiro fica situado num lugar altaneiro e estratégico, de onde os monges podiam avistar a tempo os inimigos de Cristo, para além de poderem contemplar o maciço rochoso que os envolve. No Inverno, este lugar seria certamente inacessível!

                                 Agora que o tempo está a mudar, as nuvens abatem-se sobre os Picos da Europa, vejo-me obrigado a confessar que foi necessário aqui chegar para que finalmente lêsse A MORTE DE IVAN ILITCH, de Lev Tolstoi, novela datada de 1886. Uma escrita minuciosa e descarnada que põe a nu a fragilidade do homem no momento de enfrentar a morte. E, sobretudo, reflecte sobre a mentira da vida, num tempo em que ainda se procurava acreditar na verdade.

Da leitura desta obra, retiro a ideia, que me não é estranha, de que a doença nos torna  insuportáveis para os que nos rodeiam (familiares, amigos...). Pior do que o envelhecimento, a doença cria uma hostilidade que nos mina até que "ela" nos sufoque... Tolstoi, nesta pequena narrativa, coloca-nos perante a doença, como eu me encontro perante a grandeza e o peso das montanhas que me cercam...

3.8.08

Crueldades...

De regresso ao Museu da Electricidade. Pretexto: ver as exposições em cartaz e ouvir jazz às 11:30 horas. De facto, já as vira e não me deixara fascinar completamente. Callas não me seduz; sobretudo, a encenação irrita-me.

(Tempos antigos. Um dia, no exame de Francês do antigo 5º ano do Liceu, o examinador resolveu pôr à prova a minha cultura musical e perguntou-me quem era a diva da ópera. Vá lá saber-se como: acertei. A ópera, porém, fere-me os neurónios. Absurdo? Falta de cultura? Rusticidade!)

Quanto à exposição "Vieira da Silva, Arpad Szenes e o Castelo Surrealista", desde que a vi pela primeira vez, fiquei fascinado com o quadro Marie Helène IV, 1942. Tudo o que sei de Arpad Szenes está naquele quadro.

Para me compensar da minha frieza face à ópera, duas senhoras aproximaram-se da exposição "Vieira da Silva..." e uma (a mais nova, talvez filha, como escreveria o Cesário Verde) disse para a outra: «Ali, está uma, mas não tem interesse!», num gesto de enfado.

Às 11:30, começou o concerto. Agradável, suave... mas, quando a melodia se torna repetitiva, entro num processo de vigília... só desperta por duas enormes antenas que me deixaram a pensar se não seriam as mesmas que conheci, noutro tempo, em Murfacém, ao serviço do Exército..., onde passei um ano, no Centro de Informações e Segurança Militar. O CISM era a unidade responsável pelas actividades de criptologia, informações, contra-informação e segurança militar do Exército.

Curiosamente, não me lembro, de nesse tempo, ter avistado do alto de Murfacém, o edifício que acolhe, hoje, o Museu da Electricidade.  Talvez possa, no entanto, explicar essa lacuna: a minha espinhosa missão decorria das 18 às 24 horas e, talvez, a noite caísse mais cedo... ou, então, era a ignorância a falar mais alto!

1.8.08

Os frabões

São ardilosos e vaidosos. Olham-nos lá do alto, com comiseração. O povo nada sabe e devia estar agradecido.

Se o Presidente se interroga sobre a perfídia que lhe quer furtar o pouco poder de que ainda dispõe, o unanimismo responde que o Senhor Presidente acordou tarde e mais valia ter ido de férias.

Em Portugal, o Presidente deve ir a banhos e no tempo de sobra, o melhor que tem a fazer é ajudar a Senhora, sua esposa, a limpar o pó aos presépios.

Afinal, as Ilhas há muito que deixaram de ser nossas! Os frabões aderiram à descolonização mental:

Abaixo os símbolos!

Acima os interesses!

28.7.08

Tristes heróis... os "frabões"!

Exame de Português 2ª fase. Desta vez, a prova permite que os alunos demonstrem que leram O Memorial do Convento. No entanto, muitos deles limitaram-se a ler as "sebentas" e mal. Por outro lado, a pouca leitura torna-se evidente quando lhes é proposto que reflictam sobre a importância do "herói" na vida de cada um de nós... Aos valores, dizem não, obrigado. Um pouco de cultura literária teria dado um resultado menos oco e simplista. Já, agora, acrescento que o M.E. continua, nas propostas de classificação, a atentar contra o rigor e a idoneidade. Sinal dos tempos. Apesar de tudo, os portugueses merecem melhor...

A falta de rigor e a falta de idoneidade derramam-se pela sociedade portuguesa. Bem pode o prof. Freitas do Amaral argumentar que um senhor presidente prevaricou que, de imediato, lhe é retirada a "autoridade" que noutros tempos lhe era reconhecida como discípulo de Marcelo de Caetano. Bem pode o Procurador da República proclamar que, com o fim do segredo de justiça, os grandes beneficiados serão aqueles que têm ao seu serviço os maiores escritórios de advogados que, logo, surgem aqueles que consideram que o senhor procurador está a exagerar como é seu costume. Bem pode o eng. Cravinho protestar contra a impunidade de que gozam os maiores corruptos deste país que, a pouco e pouco, se desenvolve a ideia de que também ele é facilmente "comprado"... afinal, onde é que ele está e o que é que anda a fazer?

Ultimamente, tenho vindo a pensar se isto não é tudo uma questão de assessores, de conselheiros, de consultores, de directores espirituais? Como é que esta pandilha (corja) chega junto do poder? Quem é que representam?

Vivem no silêncio dos gabinetes, trabalham desalmadamente, escondem-se dos meios de comunicação social, mas estão em toda a parte, como os frades do país de Garrett. Serão frades? Serão barões? Ou a mistura de ambos: uma espécie de "frabões"... Uma amálgama inútil, mas presente...

PS: Já agora: O que é que passou pela cabeça do Manuel Alegre, quando recomendou que o José Sócrates deveria ler "As Causas da Decadência dos Povos Peninsulares", do Antero de Quental? E eu que pensava que essa leitura era obrigatória para quem deseje inscrever-se no Partido Socialista!

A não ser que, lá no íntimo, Manuel Alegre sonhe com o dia em que, acabrunhado e desiludido,  José Socrates beba a cicuta ou se suicide na escadaria da sede do P.S.!

21.7.08

Uma entrevista feliz a Félix Bolaños...

Há pessoas tão obcecadas com a carreira que se tornam cruéis e despóticas. Têm uma auto-estima tão elevada que ignoram permanentemente o outro, não tendo tempo para o ouvir, para tentar perceber os seus limites e, sobretudo, a sua idiossincrasia.

O ser humano, por muito desclassificado que o possamos considerar, tem sempre, em si, uma chama que deveríamos alimentar, não a reduzindo a cinzas, a todo o tempo.

Félix Bolaños, responsável pelas escolas da Apelação, na entrevista que concedeu a José Manuel Fernandes e a Raquel Abecassis, surge como um homem que conhece a realidade local, com um pensamento estruturado e alicerçado, pragmático e optimista, que ousou entrar no interior dos bairros e procurar neles as lideranças, de modo a que estas possam ser âncoras na alteração de mentalidades e comportamentos.

Não sei se alguém decidiu propô-lo para professor do ano, mas, na minha modesta opinião, o modo como actua, como analisa e contextualiza os acontecimentos, como encara a comunicação social, é suficiente para que eu registe aqui o seu nome - Félix Bolaños.

Em grande parte, Félix Bolaños corresponde ao perfil que entendo dever ser o do director executivo de uma escola ou de um agrupamento.

Já agora quero acrescentar que, até à data, nunca tinha ouvido falar de Félix Bolaños.

20.7.08

Nem sempre a luz chega onde é necessária...

Em Setembro de 1908, começou a funcionar, a título experimental, a primeira turbina da Central Tejo.

Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical – / Grandes trópicos humanos de ferro e fogo e força –“ /Álvaro de Campos, Ode triunfal, 1914

Só, hoje, visitei o Museu da Electricidade, em Lisboa. E é pena porque se o tivesse feito antes, já teria tido a ideia que me ocorreu. Há neste Museu matéria mais do que suficiente para ajudar a compreender a Lisboa do final do século XIX (Eça e, sobretudo, Cesário Verde) e, em particular, a Ode Triunfal de Álvaro de Campos.

E a ideia é simples: proporcionar uma visita guiada aos alunos do ensino secundário.

Começo a pensar que o M.E. deveria apostar num roteiro museológico devidamente articulado com os programas em vigor. Com tantos recursos humanos subaproveitados, não creio que seja difícil criar uma equipa multidisciplinar que se ocupe deste projecto.

/MCG

13.7.08

Aproveitamento de água


Há quem afiance que, aqui, em Pedreiras, já houve mar. Não tenho dados. Pedras, confirmo. Vegetação de tipo tropical, também... e, sobretudo, no passado, havia quem soubesse como aproveitar a água da chuva e, sobretudo, da serra...

Casa em ruínas

São 4 os altivos cavaleiros que cobrem a entrada da misteriosa casa em ruínas que, postada do lado esquerdo da ruela, nos deixam a sonhar com os desaparecidos viventes que, há não muito tempo ainda, se imaginavam senhores do tempo, em Pedreiras, lugar descoberto, por mim neste fim de semana, bem perto de Porto de Mós.
Em Pedreiras, existe um belo parque de campismo, da responsabilidade da Junta de Freguesia. Um parque só para mim! Nenhum outro campista ou caravanista ousou entrar naquele cuidado recinto, ladeado por um circuito de manutenção e por um mini parque desportivo.
Ao sair daqui, talvez venha a compreender que, por um tempo, vivi do outro lado da vida, e ao passar junto da casa em ruínas não deixarei de dar uma olhadela respeitosa e agradecida aos majestosos quatro cedros.
PS: Se decidir passar por este parque de campismo, não se esqueça de passar pela mercearia.

9.7.08

O riso e o choro...

« Ou talvez o riso seja uma língua anterior que fomos perdendo à medida que o mundo foi deixando de ser nosso.» Mia Couto, Venenos de Deus, Remédios do Diabo, 2008

Este romance é de rir e de chorar mais. O argumento repleto de peripécias surpreende e encanta a cada momento: o segredo escapa a cada revelação, precipitando a verdade numa  vertiginosa cascata  que nos inunda de inesperadas emoções...

II

Todo o dia de hoje e, também, o de ontem me deu vontade de chorar: a vontade de servir e de dominar é tão forte que nem a lei escapa à vontade de a torcer: a DGRHE quer fazer o milagre de tornar o "avaliador" em supervisor pedagógico... como se pudessemos gerar milhares de supervisores em 22 horas de formação, como se os avaliados estivessem dispostos a reconhecer ao avaliador não só a competência de os classificar e de o seriar, como também a competência de os guiar, com base em três observações de aula... e numa lista interminável de itens. E tudo isto, de borla, e sem redução significativa da carga lectiva...

Infelizmente, já vimos esta forma de trabalhar. Basta lembrar o modo como foi lançada a "profissionalização em exercício". Quem se lembra? O efeito é sempro o mesmo: a degradação da qualidade pedagógica e o consequente empobrecimento do país...

Venenos de Deus, Remédios do Diabo! A metáfora absoluta, já  que como afirmou (?) Fontanier: no limite, todas as figuras são metáforas.

7.7.08

Resultados...

Afinal, estou um pouco acima da média nacional (9,7). A média dos "meus" 35 alunos que se apresentaram ao exame de Português - 1ª Fase - foi de 12,383.

Estes resultados, no entanto, para mim, não são convincentes: Alunos houve que foram prejudicados porque o seu trabalho não foi devidamente testado.

Olhando para os resultados da Matemática, não posso deixar de ficar perplexo. Sempre pensei que a Matemática beneficiava de um bom desempenho na disciplina de Português!

6.7.08

9,7

Português - 12º Ano - Média nacional de 9,7 na Prova 639, 1ª fase!

O Ministério reage, referindo que «importa equacionar medidas de reforço do trabalho dos alunos nesta disciplina, designadamente estendendo ao ensino secundário as dinâmicas do Plano Nacional de Leitura.» Mais um tiro no pé!

1º Esta  prova deveria ter testado os conteúdos leccionados e as competências desenvolvidas ao longo de 3 anos. Isso não aconteceu. Todos o sabemos. Não vale a pena fingir o contrário. A prova da 1ª fase é indefensável. Aplicados todos os critérios, nenhum aluno poderá ter obtido 20 valores. Nem mesmo 19!

2º A Gramática ou é trabalhada de forma sistemática ou as perguntas sobre o funcionamento da língua mais não serão que "exercícios" vazios e previsíveis. Foi o que aconteceu. O II Grupo, objectivamente, não testa as várias "gramáticas" que circulam na praça editorial. Salve-se o negócio!

3º Se pensarmos que os 65.000 alunos que se candidatam ao exame de Português, ao longo dos últimos três anos, leram, pelo menos, três livros, na modalidade de contrato de leitura ( literatura nacional e estrangeira), teremos 195.000 obras lidas e, provavelmente, apresentadas na sala de aula, pondo em destaque a oralidade e a escrita. A essa leitura, obrigatória de acordo com o Programa em vigor, a Prova de 1ª fase nada diz.

4º O Senhor Secretário de Estado, Valter Lemos, provavelmente nunca leu o Programa de Português. E é pena! Se o fizesse, quero crer que, de imediato, mandaria a Inspecção verificar por que motivo, a Prova 139 não respeita o trabalho dos professores e dos alunos. Por que motivo, sobre a leitura das obras "contratadas", não há uma pergunta aberta e de desenvolvimento. O GAVE ignora que a leitura é uma forma de descoberta essencial para o desenvolvimento das sociedades e, sobretudo, teme que a leitura se torne numa força "crítica" que arrase o espartilho a que este Gabinete de Avaliação submete alunos e professores, menorizando-os. 

5º Senhor Professor Valter Lemos, nas escolas, começou por haver uma dinâmica de leitura.  Quem a destruiu foi quem elaborou as provas! Hoje, qualquer professor perguntará: - investir no contrato de leitura para quê? Quem a destrói é quem manda elaborar as provas! Quem a destrói é quem prefere uma dinâmica de leitura exógena a uma dinâmica endógena. Quem a destrói é quem, no passado, queimou os autores da lusofonia, subverteu os programas, eliminando a leitura extensiva, para, finalmente, aniquilar a Literatura! Há muito que a leitura, em Portugal, foi entregue aos caprichos de alguns grupelhos que nada lêem.

6º Senhor Professor Valter Lemos, se tiver oportunidade (Garrett diria que essa é a obrigação do Governante) passe pela Fábrica de Braço de Prata: entre, olhe à sua volta e contemple o estado da cultura, o estado do livro, o estado da leitura - contemple a nação que, ainda há pouco, respirava no Bairro Alto e, agora, vegeta em Marvila, à espera da ordem de despejo... começo a lembrar-me de uma estalagem, lá para os lados do Cartaxo...

9,7 não corresponde à média nacional! Corresponde, sim, à média dos que ocupam os gabinetes do Ministério da Educação e arrasam todo o trabalho feito por aqueles que, diariamente, trabalham horas intermináveis para que os jovens não desistam da leitura e da escrita, não se acomodem nas poltronas da indiferença.

Como diria Pepetela: "O nosso país é bué" ou, concluindo a estória - "afinal, o nosso país não era assim tão bué como imaginara." Ver Contos de Morte, edições Nelson de Matos

Nota1: Esta última referência não é destinada ao Senhor Secretário de Estado, pois sei que não tem tempo para este tipo de leituras. É para algum aluno que ainda não tenha sido submetido ao Plano Nacional de Leitura e que queira compreender um pouco mais do mundo em que vivemos.

Nota 2: Amanhã, como todos os professores de Português, lá terei que fazer contas para saber se os meus alunos estão acima ou abaixo do 9,7!

Sim, porque um Senhor Secretário de Estado decidiu que a minha avaliação passasse a estar indexada a este mágico número: 9,7.

Resta saber se os serviços do Ministério não fizeram mal o cálculo, tal como aconteceu há dias com o Ministério da Saúde.

29.6.08

Ribeira de Ilhas

Assim a ribeira invisível se perde numa língua de areia que só chega ao mar se a maré estiver cheia. Surfista cansado, deslocado da imagem, procuro o que lá devia estar, mas só encontro estilhaços de uma pedra malvada que me lembra que, por maior que seja o esforço, há sempre um pedaço de asno capaz de nos acusar de soberba e vaidade...
A semana que termina rola, farta da pequenez e da mediocridade de pequenos diabretes, para a espuma enrolada de um oceano risível de imagens e de amálgamas audaciosas de um romance pós-colonial: Venenos de Deus, Remédios do Diabo, de Mia Couto. Uma escrita que, num humor refinado, nos penetra nas entranhas, deixando a nu a miséria mental humana, como se uma pedra da calçada nos estalasse o crânio, sem sabermos se definitivamente nos destrói a vontade.
/MCH

22.6.08

O escritor-operário...

Hoje, fui ao Palácio da Ajuda... À porta, o rei D. Carlos I, que antes de ter sido imolado pela revolução, nos teria devolvido à Europa... Quem diria?

Na Galeria de Pintura do Rei D. Luís I, para lá da consistência dos sonhos, encontrei um Saramago metódico e, sobretudo, operário. O escritor-operário, tal como acontecera com os escritores realistas e naturalistas... A leitura seus dos registos de leitura é preciosa para a compreensão do ofício do autor.

Por outro lado, encontrei a memória de um país mesquinho, onde Mafra simboliza (séculos XVIII e XX) a megalomania de um rei, a manha do clero,  o conflito entre moralistas conservadores e ideólogos estrangeirados...

Pareceu-me que as mulheres de Saramago foram esmagadas pela estrangeira Pílar. E que Ilda Reis foi injustamente atirada para a sombra, como se sua pujança atrofiasse o criador.

Ficou-me, também, a sensação de que a literatura crítica é modesta para a extensão da obra do nobel (1998).

Finalmente, a timidez e altivez, típicas do ribatejano, atravessam as imagens, como se Saramago tivesse descoberto como esconder a nudez da sua presença..., uma presença convicta e impaciente por saber o que o espera. Que bom que seria que, afinal, as mentiras fossem verdade!

21.6.08

O ardis de Camões...

Nas estâncias 89 a 91 do Canto IX de Os Lusíadas, o Poeta persuade o censor. Os deuses da Grécia e da Roma antiga mais não eram do que homens de "fraca carne humana" que, pela nobreza  das suas acções, se tinham visto imortalizadados na memória dos restantes humanos. Estes deuses que pareciam rivalizar com o Deus da cristandade, afinal eram "fingidos" pela emoção (ou pela razão?) humana. O censor terá compreendido a mensagem...

E por isso, sabendo o Poeta que o homem português procurava a "fama" / a glória, convida-o à acção, a imitar os homens da antiguidade, porque se o fizer, também, terá direito à imortalidade dos deuses. Apenas lhe impõe um limite: não ceder à cobiça. Para o censor, este travão era o ouro que faltava  para que a obra fosse libertada de qualquer suspeita...

E para nós, deveria significar que o Poeta era um homem ardiloso, capaz de nos limites da heresia, mostrar a face cristã quando, de facto, o homem ( a humanidade) era a sua crença escondida.

As estâncias 92 e 93 do Canto IX ajudam-nos a compreender como Camões fez passar os Lusíadas pelas malhas da censura...

Mas nada disto interessa aos modernos censores: a leitura, ontem como hoje, continua muito superficial...

E de repente, dou comigo a pensar na blindagem  a que estão submetidos os mediadores. No seu inesperado silêncio...

18.6.08

Prova 639 / 1ª Fase

O erro dos anos anteriores acentuou-se.O esforço dos estudantes e dos professores é desrespeitado, porque um dos objectivos do Programa de Português é compreender, na MENSAGEM, a reescrita de OS LUSÍADAS, adaptada ao tempo decadente e caótico de Pessoa.

No primeiro quartel do séc. XX, o sono pátrio entontecia o Poeta, ao ponto deste ter escrito uma série de pequenos poemas cuja mensagem exortava o povo a despertar do «sono do ócio ignavo»...

A ideia da decadência do tempo português é uma constante na literatura portuguesa, alimentada de dentro e com consequências intoleráveis neste tempo global. Ora, ninguém melhor que a juventude pode expressar a vontade de ruptura necessária à sobrevivência da identidade portuguesa. No entanto, nesta prova, ninguém se lembrou desta hipótese de desenvolvimento temático.

Não vale a pena proclamar que o texto seleccionado não foi devidamente analisado, pois a grelha interrogativa não é gerada pela riqueza de conteúdo do texto literário. É uma grelha estereotipada que inviabiliza a avaliação das capacidades de compreensão, de interpretação e de expressão. Para que serve a estância 93? Para suportar a pergunta 4? No entanto, essa pergunta não permite que o estudante revele se compreendeu o pensamento de Camões!

Não vale a pena reclamar da amputação do texto de Luís Francisco Rebelo, já que José Saramago merecia comentador menos comprometido... Por outro lado, as respostas fechadas exigem itens menos manhosos, cuja solução não resulte de um raciocínio por  exclusão de partes. O acerto deveria revelar compreensão e não confusão, como aquela que se instalou na APP, impedindo-a de apresentar a resolução da prova, mesmo que o desencontro com o GAVE pudesse penalizar vis interesses...

Não vale a pena citar o Padre António Vieira quando é público que os jesuítas não reconheceram aos negros a mesma dignidade dos índios. Há certas citações de autoridades em questões de cultura e de literatura que, por vezes, dão que pensar. Esta prova trouxe-me à memória António José Saraiva, Óscar Lopes, Jorge de Sena, Carlos Reis... Há certos atropelos que são imperdoáveis!

Não vale a pena concluir que os professores que procuram cumprir os programas se sentem atraiçoados e que os estudantes mais aplicados são os mais prejudicados. Não vale a pena!

A literatura é, hoje, escrava da mediocridade. Camões, Vieira, Saramago foram convocados para um banquete que nem de trovas chega a ser.

12.6.08

Uma "raça" em dificuldade!

"Les difficultés sont des questions d’intellectuel et d’académie. Il n’y a pas que des difficultés en Afrique." Sembène Ousmane

Se até o Presidente da República, para evitar a actualidade / dificuldade, sente necessidade de se refugiar na linhagem, na estirpe, na raça... e nos convida ( eternos jogadores!)  a olhar, de soslaio, o Tejo e o Atlântico...

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Em Portugal, qualquer obstáculo se torna, de imediato, numa dificuldade. A barreira convida-nos a saltá-la, mas nós preferimos cavar trincheiras, enfiar a cabeça na areia e ficar, por ali, a estrebuchar.

Perante o bloqueio, ficamos expectantes... zancamos no governo e reiteramos que a dificuldade é insuperável. Todos sabemos que o número de camiões que circula nas estradas é insuportável; que o custo desta circulação em vidas humanas e em termos ambientais já há muito ultrapassou o tolerável... mas não, em vez de levantarmos a cabeça, exigindo ao governo que seja inflexível e que desenvolva uma política de transporte menos onerosa e poluente, apostando na ferrovia, continuamos fascinados pela arruaça e pela grosseira saloiada.

As imagens dos piquetes, que arrancam condutores indefesos do interior dos camiões, mostram um povo à beira do abismo..., um povo incapaz de se adaptar às leis do mercado global e, sobretudo, incapaz de se defender de umas centenas de arruaceiros... porque, há muito, deixou de ter iniciativa, vivendo na sombra do estado-providência... um povo que espera que o seu futuro se resolva num campo de futebol, numa jogada de sorte...

8.6.08

Questão de última hora...

 

Num destes últimos dias, vários alunos perguntaram-me: «- O que é que pode sair no exame de Português?»

Respondi-lhes que não arriscava nenhuma indicação. No entanto, hoje, lembrei-me que os autores das provas de exame costumam gostar de efemérides. E no próximo dia 13 de Junho, 4 dias antes do exame de Português, faz 120 anos que o Poeta Fernando Pessoa nasceu.

O Poeta que, um dia, escreveu: «Quem não vê bem uma palavra / não pode ver bem uma alma

O Poeta que, por outro lado, acrescentava: «A orthographia etymologica é a expressão graphica da continuidade da nossa cultura (...) para fixação dos meios materiaes do Imperio, ha que adoptar a fixação da linguagem, e, antes de mais nada, a orthographia etymologica, excluindo as estravagancias simplificadoras creadas pela influencia da politica extrangeira.»

Se eu tiver razão, lá teremos milhares de alunos a tentar decidir, em duas horas, o que os génios da língua não conseguiram decidir em dezenas de anos!

E já, agora, pergunto: - O que é que os actuais alunos entendem de etimologia? Para Pessoa, a etimologia é uma espécie de seguro: mostra-nos as raízes da nação, do império. Se deixarmos de as regar, a pátria morre e o império perde-se nas brumas... E foi por isso que releu Camões, revisitou Vieira e foi viver com D. Sebastião nessa outra dimensão a que só a almas podem aceder...

Por isso, se os meus alunos voltarem a colocar-me a questão do que estudar, responderei: procurai o FUTURO em Camões e Pessoa, e não descureis Sttau Monteiro e Saramago..., pois, também, eles o procuravam na fogueira que iluminava os céus de Lisboa. 

Sem medo, o General

 A 8 de Junho de 1958, o General Humberto Delgado votou na "mesa" do Liceu Camões, ciente de que a sua candidatura não teria qualquer hipótese de vencer as eleições presidenciais, embora a "multidão" que o aguardava na Praça José Fontana indiciasse que o povo queria a mudança, ansiava pela liberdade.
A Escola Secundária de Camões, também, não deve esquecer o dia 18 de Maio de 1958, data do 1º comício do General Sem Medo, no Ginásio. Esse dia definiu os dois lados da barricada e acabou aos tiros nas ruas vizinhas, sem poupar a rua Gomes Freire d'Andrade... Coincidências! - deverá pensar um aluno do 12º ano, a braços com "Felizmente Há Luar!...
Estas efemérides fazem parte da "cultura" da Escola, tal como a participação desta instituição no Museu Oriente deve ser registada, apesar da fraca visibilidade da sua colaboração. Diga-se, de passagem, que o Museu Oriente está a agir mal, quando, num Domingo, o Serviço Educativo encerra, impedindo, deste modo, que muitas das famílias que, ali, se deslocam possam observar a participação dos seus filhos. É um objectivo educacional que não deve ser desprezado. A não ser que o convite feito às escolas não passe de uma estratégia de marketing!

7.6.08

Por uma escola de qualidade...

A qualidade da escola depende do grau de participação daqueles que a constituem. Não creio que este princípio possa ser facilmente contestado. No entanto, temo que uma série de pessoas pensem poder desenvolver os seus projectos pessoais à revelia da participação dos estudantes, dos professores e dos  funcionários...

Ontem, no Auditório 'Camões' decorreu a entrega de prémios do III Concurso Literário Camões. Evento da responsabilidade das professoras Lídia Teixeira e Paula Lopes, do Departamento de Românicas, e presidido pela Drª Isabel Ramos, foi com alguma emoção que assistimos aos passos trémulos, mas prometedores, de jovens criadores, apresentadores, leitores e músicos naquele palco cuja função deve, doravante, acolher iniciativas do mesmo cariz.

É, ainda, de saudar a iniciativa de editar e disponibilizar, de imediato, os textos dos concorrentes. Do índice de autores ressalta a ideia de que,  numa dúzia de turmas, houve forte adesão ao concurso.

Esperemos que as restantes turmas estejam presentes no próximo ano. Esperemos, também, que o IV Concurso Literário Camões seja um dos pilares das Comemorações dos 100 anos do edifício da Escola Secundária de Camões.

A Escola existe para os estudantes. Sem eles de pouco pode servir... E, também, eles necessitam de saber que, ali, entre aquelas paredes, houve outros como eles que sonharam mudar o mundo ou, pelo menos, torná-lo mais próximo... 

28.5.08

Esta manhã, a morte andou por perto...

Às 7 horas e 40 minutos, esta árvore caiu de podre. Ali mesmo, no meio do passeio, junto ao Mercado 31 de Janeiro, em frente do Hotel Fontana e com vista para a Escola Secundária de Camões. Por sorte, nenhum transeunte foi traído pelo destino!
Na mesma rua, há pelo menos duas árvores no mesmo estado de decrepitude.
Esperemos que os Serviços Municipais dêem mais atenção às árvores da nossa cidade, porque, da próxima vez, o destino será menos benfazejo...


27.5.08

Um humanista com memória no lugar da espada...

José Luís Falcão de Vasconcellos deu, hoje, a última aula perante uma plateia atenta, apesar de diminuta. E é pena, porque o Homem, que tanto tem contribuído para conservar as pontes que ligam o passado ao presente, certamente teria apreciado uma maior participação da Escola Secundária de Camões.

No seu projecto educativo, esta escola define como objectivo: «criar condições para que o património e a cultura de qualidade da Escola tenham continuidade na educação e formação dos alunos.» José Luís Falcão de Vasconcellos é, de todos, aquele que, nos últimos anos,  mais tem contribuído para a preservação do património cultural, criando as pontes necessárias ao diálogo com o presente e o futuro.

Se a escola se esquecer de "situar" os seus alunos , no saber, na experiência e na abnegação do professor José Luís Falcão de Vasconcellos, então, terá deixado de cumprir a missão para que foi criada.

A  escola tem, hoje,  nas suas mãos, a hipótese de reparar a falta de memória que nos tem destruído a "alma". Basta que na definição dos objectivos institucionais e individuais não hipoteque a "lição" do professor José Luís Falcão de Vasconcellos, e embainhe definitivamente a espada.

26.5.08

Tudo tem um fim...

Tenho para mim que devemos fazer sempre tudo o que está ao nosso alcance para resolver os problemas. Mas esta minha convicção pouco ou nada vale.

Se a gasolina está mais cara, as vozes do costume dizem: congelem-se os preços. E Ninguém quer saber das vantagens desta situação: diminui a poluição, cessam os engarrafamentos, o governo começa a pensar na solução ferroviária, as auto-estradas tornam-se desnecessárias. Basta lembrar os milhares de  camiões que percorrem as estradas nacionais e europeias para nos abastecer. Se à solução ferroviária aliássemos uma maior aposta na agricultura, nas energias alternativas e nas novas tecnologias, talvez ficássemos menos subsídio-dependentes e descobríssemos finalmente a Índia dentro de nós.

Se as escolas são confrontadas com um novo modelo de gestão e de avaliação, as vozes do costume gritam: congele-se a mudança. Mudar para quê? Ninguém quer saber se há alguma vantagem: uma planificação a tempo e horas, capaz de combinar  a prática lectiva com a intervenção na escola e na comunidade, capaz de suportar a formação contínua com a avaliação docente, é adiada para o calor da refrega que se anuncia para Setembro.

Afinal, estamos em Portugal! Mas com uma pequena diferença: a Índia de outrora não existe mais. As especiarias, os escravos, os judeus,  a cana, o ouro, o alcool, os diamantes, o cacau, o caminho de ferro de Benguela, Cabora Bassa, o petróleo, os emigrantes, os imigrantes, o turismo, o euro, tudo tem um fim.

24.5.08

A minhoca...

Nunca simpatizei muito com a minhoca. Nem sequer me costumo dar ao trabalho de observar o seu movimento e cor. Diga-se que, apesar de tudo, simpatizo menos com a minhoca preta e, sobretudo, com o seu cheiro. Da verde não tenho qualquer memória olfactiva, apenas o receio de que ela se insinue na folha de couve ou de alface ou faça do feijão verde a sua morada traiçoeira.
Mas, hoje, sofri uma aparição: de uma cesta de morangos   escorregou uma minhoca verde, que, ao sentir-se descoberta, logo se enroscou, numa tentativa desesperada de escapar ao iminente afogamento.
De facto, na história da minhoca, verde ou preta, há sempre uma que, quando se sente acossada, se enrosca como se o que vai acontecendo nada tivesse a ver consigo.

22.5.08

Da educação...

O legislador parece convencido que vivemos no melhor dos mundos: os pais estão todos empregados e são bem remunerados; os patrões são tão compreensivos que os libertam as horas necessárias para que possam acompanhar os filhos à escola, na hora de entrada e de saída, para que possam responder às solicitações do director de turma e, também, para que possam participar na gestão da própria escola, elaborando o regulamento interno e o projecto educativo e, até, decidir a escolha do director executivo.

O legislador parece acreditar que se existe algum problema com os pais trabalhadores, ele é pouco significativo, pois a maioria dos pais é patrão (oa) de si próprio (a), podendo dispor do tempo como bem lhe aprouver.

O legislador supõe ainda que o desemprego dos pais pouco afecta os filhos, pois o Estado encarregar-se-á de fazer com que nenhuma família passe fome ou esconda a miséria em que vive... Se houver sinais de que algumas crianças chegam à escola a dormir, atrasadas, sem nada ter comido desde o dia anterior, o legislador entenderá que isso será residual e só afectará os filhos dos imigrantes que rapidamente abandonarão o país à procura de melhores horizontes...

Por outro lado, a Escola parece convencida que a sua é função é, apenas, ensinar, pondo de parte qualquer princípio educativo. Na melhor das hipóteses, aceita cooperar com as autoridades de modo a assegurar um mínimo de disciplina. E o legislador determina que do currículo do director se elimine qualquer referência à educação: o director deve gerir recursos, deve disciplinar alunos, professores e funcionários. E o legislador cria o conselho geral (provisório ou definitivo) cuja constituição não passa de uma correia de transmissão da baixa política local. E, finalmente, o legislador amarra o conselho pedagógico à vontade disciplinadora do director...

Só não compreendo por que motivo o conselho pedagógico não perde, de vez, a referência à pedagogia... à educação.

Provavelmente, este texto é um bom exemplo do espírito reaccionário que me atormenta. O problema é que «reaccionário» é aquele que reage contra a «situação». E sobre a «situação», há muito mais a dizer. Afinal, quem é que receia a mudança? Quem é que pôs termo à «revolução»?

21.5.08

Tudo num movimento de recuo...

Parede branca

No canto superior esquerdo, uma argola

Da argola solta-se uma corda

À direita, uma mão prende a corda

À esquerda, outra mão puxa a corda

Ao centro, várias mãos esticam a corda

Tudo num movimento de recuo...

Parede branca

Ao centro uma foice

Da foice solta-se uma mão

A mão segura a corda

Outra mão puxa a corda

De costas, várias mãos atam a corda

Da corda solta-se um pescoço...

Parede branca

No canto superior direito, um crucifixo

Do crucifixo escorre a noite

Em fundo, o martelo fere a bigorna...