3.5.07

A verdadeira medida da Desmedida...

Num tempo em que me dou conta da luta diária pelo poder, seja em França, no Iraque, no Irão, nos Estados Unidos, na Venezuela, em Angola... na Câmara de Lisboa ... ou, mesmo, na Esc. Sec. de Camões, não posso deixar de reflectir sobre a natureza excessiva desses combates. Nuns casos, porque os projectos são desmesurados e irrealistas, noutros porque inexistentes ou, pelo menos, subterrâneos. Raramente, os destinatários são envolvidos na construção dos projectos que, em princípio, lhes dizem respeito. Não sei se estamos perante um fenómeno que possamos classificar como desmedida!?
Sei, no entanto, que Ruy Duarte de Carvalho publicou, em 2006, um conjunto de crónicas a que deu o nome de Desmedida. Ler esta obra pode transformar-se numa viagem de consequências imprevisíveis, pois, cedo, desperta a vontade de seguir os caminhos do autor em torno do desmesurado rio S.Francisco. Mas segui-lo, supõe todo um programa, cujos contornos nos obrigam a viajar do séc. XVI ao séc. XXI, de modo a perceber por que motivo a colonização do Brasil foi diferente da angolana, apesar do colonizador ser o mesmo, apesar dos holandeses que procuraram simultaneamente ocupar os dois territórios, apesar do «brasileiro» ser fruto da mistura do branco europeu com o negro africano, apesar de, em momentos vários, o «brasileiro» ter sido atirado para os braços de Angola.
Numa viagem fascinante, Ruy Duarte de Carvalho dá conta da extensa investigação que fez no terreno, observando e lendo. Lendo e cruzando: Cadornega, Blaise Cendrars, Sir Richard Burton, Guimarães Rosa, Gilberto Freyre, Euclides da Cunha... o engenheiro Theodoro Sampaio - verdadeiro protagonista da desmedida brasileira... Tudo para poder responder às perguntas do velho Paulino e, sobretudo, quando for visitar os pastores cuvale, pois, há muito que o autor chegou à evidência:
«Quem é analfabeto nada lê, de facto, e também de facto pouco ou nada lêem aqueles que beneficiaram de aprendizagens modernas mas evitam, recusam mesmo, porque antes de mais lhes intimida, toda a escrita que não lhes proponha uma sopa de letras liquidificada pelas tecnologias da mediatização, ou propostas ditas literárias devidas a talentos jornalísticos assim-assim que para se imporem chegam até a vigiar-se de muito perto, não venham a incorrer na desvantagem de querer voar eventualmente mais alto, o que aliás acabaria, quem sabe, por revelar, também, a efectiva tibieza dos seus talentos.» op.cit, pág. 225
No que me diz respeito, creio que, por uns tempos, vou viajar com Ruy Duarte de Carvalho para que ele me possa guiar pelos sertões da alma humana, à procura da verdeira medida da desmedida...

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