4.5.07

Os valores da desmedida...

À nossa escala, a ideia de prolongar em mais de 600 km os mais de 2700 que constituem o curso natural do rio São Francisco é insensata, faraónica, megalómana, mas à escala brasileira tudo será diferente, mesmo para os 13 milhões de pessoas que irão ser afectadas. E porquê? Porque a água é um elemento fundamental para a construção do estado brasileiro. Sem ela, a água, o Brasil desmoronar-se-á.
Portanto, a desmedida, lá, no Brasil, pode ser justa, enquanto que, aqui, é quase sempre sinal de loucura.
A escala condiciona-nos a razoabilidade: colocamo-nos permanentemente em bicos-dos-pés, quer quando olhamos para trás quer quando olhamos em frente.
Andamos numa roda viva a desfazer. Odiamos a persistência e a consistência. Admiramos o improviso, damos laudas à boçalidade, à voz grossa. Pagamos para gozar a pequena intriga. Raramente, somos justos com os vivos: ou os adulamos, ou ignoramo-los. E mesmo depois de mortos, temos sobressaltos de carpideiras, para definitivamente colocarmos uma pedra sobre o assunto...
À nossa escala, não deixamos, no entanto, de praticar a desmedida: O SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) perdeu o rasto de 200 caixas de fichas que nos permitiriam a avaliar (conhecer) o movimento das fronteiras, entre 1919 e 1975. Sem elas, ficamos impedidos de conhecer os êxodos, as migrações, as capturas, as deportações, o contrabando, a clandestinidade... o zelo de milhares de obedientes funcionários. E há anos que estas fichas deveriam ter entrado na Torre do Tombo!?
A medida da nossa desmedida é a irresponsabilidade que insiste em guardar ou em assaltar o poder.

1 comentário:

  1. A maior das desmedidas é haver sempre um escândalo a esconder um outro escândalo. Assim nos temos sujeitando e assim nos fomos aos poucos habituando...
    Não fora o continuado folhetim camarário, e ainda agora andaríamos ouvindo o alarido da Independente. Não fora a roda livre em que entrou Carmona, e de que a bem ou a mal sairá, e estas duzentas caixas dariam matéria de sobra para ameaças de demissões por consumar, mas não, nada, um fait-divers, apenas, um incidente, talvez...
    Não estranhará que um dia destes apareçam as ditas fichas esquecidas num qualquer recanto das caves do Parlamento, pouco dadas que foram a migrações forçadas.
    Não estranhará que, à semelhança do mesmo zelo da mesma Independente, tenham ido, nos idos de 79 (decorridos os cinco anos da praxe) igualmente para o maneta. Também.
    Porque também assim se (des)faz a História...

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